Por Marta Watanabe, Valor Econômico

Ao lado de uma onda de renovação e do voto “contra algo e não a favor de algo”, o quadro fiscal dos Estados pode ter contribuído, segundo analistas, para o desempenho no primeiro turno dos governadores que se candidataram à reeleição.
Neste ano, 20 governadores entraram na disputa para manter-se no comando de seus Estados. O número contempla os que foram eleitos como vice-governadores e que assumiram os mandatos neste ano com a desincompatibilização dos titulares.
O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) acredita que há, em parte importante dos Estados, uma relação entre o quadro fiscal e o resultado das urnas. Segundo ele, quando o Estado não está em boa situação fiscal, a qualidade de serviços nas áreas de educação e saúde fica comprometida, o que não passa despercebido pela população.

Nem todos os Estados recuperaram sua capacidade de investimentos. Dados de relatórios fiscais de 21 Estados mostram que de janeiro a abril deste ano o recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) cresceu 10,8% em relação a igual período do ano passado. Os investimentos aumentaram em ritmo menor, em 5,1%.

Entre os Estados em que pode se ver uma relação forte entre o resultado das urnas e o quadro fiscal, Alckmin cita Minas Gerais e Alagoas. No primeiro, a despesa de pessoal do Poder Executivo em relação à receita corrente líquida avançou de 43,5% para 48,9% do fim de 2014 para o segundo quadrimestre de 2018. Em situação financeira considerada crítica, o Estado tem atrasado pagamentos a servidores e o governador candidato à reeleição, Fernando Pimentel (PT), foi eliminado da corrida eleitoral já no primeiro turno.

Em Alagoas, a despesa com pessoal diminuiu de 49,7% para 47,1% da receita corrente líquida de dezembro de 2014 até agosto deste ano. O atual governador Renan Filho (MDB) saiu vitorioso na disputa eleitoral já no primeiro turno. George Santoro, secretário de Fazenda de Alagoas, acredita que o equilíbrio fiscal e financeiro do Estado contribuiu positivamente para a reeleição de Renan Filho. O Estado, diz ele, não atrasou salários de servidores e manteve sua capacidade de investimentos com recursos próprios. Segundo Santoro, os investimentos do governo estadual somaram R$ 800 milhões em 2017 e devem crescer para R$ 1,1 bilhão neste ano, levando em conta todas as fontes.

No Rio Grande do Norte (que não foi citado por Alckmin), o governo do Estado reduziu sua despesa de pessoal de 53,4% para 47% da receita corrente líquida de 2014 para o segundo quadrimestre deste ano, mas dá sinais de perda de fôlego financeiro, com atraso no salário de servidores, com parte do 13 º de 2017 paga somente este ano. As urnas potiguares eliminaram da disputa ao governo o candidato à reeleição Robinson Faria (PSD). O próximo governador será definido no segundo turno.

Em São Paulo, diz Alckmin, as urnas não decidiram no primeiro turno, mas levaram para o segundo round dois nomes que, segundo ele, são relacionados a seu governo: João Doria, por ser do PSDB, e Márcio França (PSB), por ter sido seu vice. Ou seja, qualquer que seja o resultado no segundo turno, a situação fiscal, diz ele, não prejudicou os candidatos. O ex-governador ressalva que a relação entre quadro fiscal e eleições tem suas exceções. “Não se aplica em todos os casos, mas em cerca de 80% deles.”

No Rio Grande do Sul, a despesa de pessoal do Estado atingiu 47,2% da receita corrente líquida no segundo quadrimestre e o governo estabeleceu cronograma de pagamento a servidores segundo a faixa de vencimentos. Ao mesmo tempo o governo gaúcho solicitou a entrada no Regime de Recuperação Fiscal oferecido pela União. A adesão ao programa tem sido citada pelo governador José Ivo Sartori (MDB) como única forma de o Estado atingir equilíbrio fiscal. Candidato à reeleição, Sartori se manteve na disputa pelo governo estadual contra Eduardo Leite (PSDB).

Para Ana Carla Abrão, sócia da Oliver Wyman e ex-secretária de Fazenda de Goiás, o quadro fiscal pode ter contribuído para alguns resultados, mas não foi o motor principal. “Uma onda de mudança definiu esses resultados, embora não descarte totalmente a questão fiscal, com exemplos como Camilo Santana [PT] no Ceará e Renan Filho em Alagoas. São dois Estados que foram bem geridos e cujos governadores foram reeleitos no primeiro turno.”

Ao mesmo tempo, porém, aponta ela, em outros Estados em que também houve boa gestão o resultado não foi o mesmo. Ela exemplifica com Paulo Hartung (PMDB), ex-governador do Espírito Santo, que não se candidatou à reeleição, mas não conseguiu fazer seu sucessor. As urnas capixabas deram vitória em primeiro turno a Renato Casagrande (PSB).

Para Ana Carla, em Estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás e Rio Grande do Sul, o que tem contado mais foi a onda de renovação. “No Rio Grande do Sul, essa onda veio com Eduardo Leite considerado bom gestor em Pelotas. Romeu Zema [Novo], em Minas Gerais, também é renovação”, aponta ela. Nesses dois Estados o nome do governador será definido no segundo turno. “Tenho dificuldade de pensar que a questão fiscal tenha sido determinante. O que predominou foi uma eleição atípica, na qual as pessoas votaram contra alguma coisa e não em favor de um projeto. Não votaram pela responsabilidade fiscal como bandeira”, diz Ana Carla.

Outro Estado em que a eleição será definida no segundo turno será em Mato Grosso do Sul. As urnas deverão escolher entre o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) e Juiz Odilon (PDT).

Jader Rieffe Julianelli Afonso, secretário-adjunto do governo sul-mato-grossense, diz que a gestão de Azambuja tem mantido a situação fiscal sob controle. Apesar de a despesa de pessoal do Estado ter avançado quase dez pontos do fim de 2014 para o segundo quadrimestre deste ano – de 38,6% para 48,4% da receita corrente líquida -, há um esforço, diz o secretário, para redução do gasto com folha. Segundo o secretário, o Estado não atrasou salários e o monitoramento feito pelo governo mostra que a despesa de pessoal está atualmente em 47,4%.

De acordo com Afonso, o avanço da folha aconteceu em razão de aumentos concedidos durante a gestão anterior, já aprovados em lei ou decididos judicialmente. Em 2017, porém, diz ele, o Estado aprovou lei para contenção de gastos. O secretário diz que o teto se aplica a cerca de 80% das despesas do Estado. Um dos parâmetros para o limite de gastos é a variação do IPCA do ano anterior.

Mudanças no sistema de aposentadorias, diz o secretário, devem permitir também redução de R$ 400 milhões no déficit previdenciário em 2018. Essas medidas, diz o secretário, devem contribuir para que ao fim de 2019 a despesa com pessoal fique abaixo do limite prudencial de 46,55% estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O teto do gasto é de 49%.

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