Valor Econômico
06/12/2019

Por Gabriel Vasconcelos

Proposta ainda está recebendo contribuições, mas deve ir ao plenário da Câmara na próxima semana

O relator do projeto de lei do novo marco regulatório do saneamento na Câmara, deputado Geninho Zuliani (DEM-SP), disse nesta sexta-feira que o texto ainda está recebendo contribuições, mas está maduro para ser votado. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, já informou que pretende levar a proposta ao plenário na próxima segunda-feira.

“Eu esperava estar aqui com o projeto já aprovado, mas coincidiu de estarmos às vésperas. O debate está maduro porque já houve duas medidas provisórias que antecederam o projeto de lei”, afirmou Zuliani em evento sobre saneamento na sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio de Janeiro.

 Em seu discurso, Zuliani disse que o saneamento precisa de três condições: ambiente de regulação adequado, atração de investimento privado e concorrência – tudo o que não existe atualmente, afirmou.

“Temos 50 agências reguladoras pelo Brasil e ficou claro que a grande maioria estava capturada por um dos lados da prestação de serviços, porque essas agências nasceram do Executivo por força de lei. Nosso projeto traz a ANA [Agência Nacional de Águas] como agência macroreguladora, para padronizar e classificar as outras agências regionais. A ANA terá papel fundamental nessa nova etapa”, disse o deputado.

Com relação a investimentos, ele disse que não é o caso de escolher o que é melhor (investimento público ou privado), mas compreender que “só o setor privado tem o dinheiro do qual o saneamento precisa”. “É o setor privado que vai lá fora captar” , disse.

Zuliani disse ainda que, hoje, impera um modelo único de contrato de programa entre municípios e companhias estaduais, deixando empresas privadas de lado. “É por isso que hoje temos esse número de só 6% de participação privada em serviços de saneamento no Brasil”, disse.

Acordo no Congresso

Segundo o relator, haverá acordo com a criação de uma janela de transição de 24 a 30 meses após a sanção presidencial para que Estados e municípios renovem os chamados “contratos de programa” (entre prefeituras e companhias estaduais) e preparem as mudanças no modelo de negócio para a entrada do setor privado.

Zuliani disse que, se o PL for analisado em plenário e aprovado até terça-feira, o Senado poderá aprová-lo até dia 17, quando encerra suas atividades nesse exercício. Como nesse dia os senadores estarão dedicados à aprovação da lei do orçamento, a ideia é que o texto chegue ao plenário do Senado no dia 16 de dezembro.

Caso se confirme a aprovação na Casa, o presidente Jair Bolsonaro poderia sancionar a lei ainda esse ano, disse o deputado.

“[O acordo] foi um apelo dos governadores, principalmente do Nordeste. Alegam que as dívidas das companhias estaduais e o passivo trabalhista são gigantes e que os Estados não conseguiriam assumir isso no curto prazo. Provavelmente a gente vai acatar esse pedido dentro de um acordo de plenário na segunda-feira”, disse Zuliani.

Ele disse que o PL hoje não conta com a concordância de todo o plenário, mas que já haveria o número de votos necessário para aprová-lo. A expectativa do deputado e membros do governo é de que o acordo em questão saia entre segunda e terça-feira. Outra dificuldade, disse, é o baixo quórum às segundas. Nesse dia, os parlamentares costumam regressar de suas bases para Brasília somente à noite.

Segundo Zuliani, as resistências, que estariam sendo vencidas, têm a ver com seu uso político histórico e a oposição de associações de classe, como as de engenheiros, diretores e demais funcionários de companhias estaduais de saneamento. Além disso, a grande maioria dos governadores do Nordeste onde há maior dificuldade de consenso, é de partidos de esquerda, mais avessos a processos de privatização.

Esses governos [do Nordeste] são mais estatizantes, com dificuldade de fazer privatizações. Então estamos incentivando parcerias público-privadas, aberturas de capital minoritário, de até 49%. O governo federal é contra esse modelo e prefere a privatização total dos serviços, mas, em algumas regiões, não haveria espaço político para isso.

Universalização

Zuliani disse que o projeto institui um gatilho para evitar que as metas de universalização levem a aumentos de tarifa ao consumidor.

Ele afirmou que a meta de universalização até 2033 dos serviços de água e esgoto no Brasil, constante no Plano de Saneamento Básico, de 2007, poderá ser relaxada na prática para que as empresas que venham a assumir o setor não sejam obrigadas a fazer investimentos altos que as levem a embutir esse custo no preço das tarifas.

“Como faltam apenas 14 anos, se o investimento em alguma região do país for muito alto e esse prazo de 14 anos estiver curto, corre-se o risco de a tarifa aumentar para a população lá na ponta. Então, estamos criando um gatilho que pode chegar a 2040 [meta de universalização] caso a justificativa de aumento de tarifa seja validada pela agência reguladora”, justificou.

Ele afirmou que, ainda assim, o PL cria condições mais precisas que a legislação atual para que as empresas cumpram as metas de expansão das redes de esgoto e água. “O contrato vai ter previsão de caducidade, com [possível] interrupção do contrato e, obviamente, multas para as empresas que não cumprirem as metas de universalização”, disse.

Zuliani afirmou que, desde 2007, quando o país cravou a meta de 2033, “nada foi feito porque o marco regulatório existente é frouxo do ponto de vista de ajustes com a agência reguladora”. Ele disse que os novos contratos a serem fechados com a a inciativa privada serão redigidos visando a expansão e com exigência de comprovação de capacidade de investimento.

“Com esse marco, a gente estima que, em 20 anos, conseguiremos o equilíbrio de 50% público e 50% privado [de participação em negócios de saneamento]” , disse.

Capacidade de gestão

O secretário de Desenvolvimento de Infraestrutura do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, disse entender que o principal benefício do marco regulatório do saneamento é gestão e não capital.

“A grande vantagem do setor privado não é o capital, mas a capacidade de gestão. O capital é só uma commodity. Quando a gente compara as tarifas públicas e privadas ou os salários dos dois setores, a gente vê que tudo é maior no setor público. Então, o que a gente está buscando é gestão”, disse, também no evento.

Mac Cord afirmou que, segundo cálculos da equipe econômica, a abertura de capital minoritário das concessionárias de saneamento em todo o Brasil permitiria a Estados e municípios levantarem cerca de R$ 30 bilhões, enquanto a privatização plena das companhias locais permitiria aos governos regionais obter R$ 140 bilhões.

Devido à diferença, o governo entende que a melhor opção é a privatização total do serviço. “IPO minoritário não melhora gestão, como nos mostra o ‘petrolão’ e coisas desse tipo”, disse o secretário.

Segundo Mac Cord, o governo entende que obras e investimentos ligados a saneamento exigirão investimentos da ordem de R$ 700 bilhões no longo prazo.