Valor Econômico
19/07/2021

Por Cristian Klein

Líderes de municípios da Baixada Fluminense veem entraves para governador do Rio executar projetos

À espera de centenas de milhões de reais, que receberão em troca da concessão da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), prefeitos da Baixada Fluminense já planejam grandes investimentos em seus municípios, mas veem como duvidosos os benefícios eleitorais para seus grupos políticos e para o governador Cláudio Castro (PL). A previsão é a de que os projetos terão dificuldade para serem concluídos devido aos entraves burocráticos e à necessidade de uma azeitada equipe técnica para desembaraçá-los das exigências dos órgãos fiscalizadores do Estado e da União. Além disso, os recursos não chegarão de uma só tacada e, no caso do governador, o prazo é exíguo para se apresentar os resultados a tempo de ser recompensado com a reeleição.

“O dinheiro da Cedae não garante nada. Ter o recurso não quer dizer que você vai entregar. Não é simples, ainda mais na velocidade que o governador precisa. Eleitor quer obra pronta. O Cláudio Castro vai ter que acertar no alvo”, afirma Rogério Lisboa (PP), prefeito de Nova Iguaçu. O segundo maior município da Baixada Fluminense receberá R$ 538,8 milhões pela concessão da Cedae, dois quais 65%, cerca de R$ 350 milhões, chegarão neste ano e serão aplicados em projetos com expectativa de conclusão até o fim do mandato, em 2024.

O montante representa mais de seis vezes o que sobra do orçamento anual de Nova Iguaçu e é aplicado em investimentos. Mas há ainda a expectativa de que, com os recursos do governo estadual, o total de investimentos no município chegue a R$ 700 milhões ou R$ 800 milhões.

Lisboa afirma que tem “enviado os projetos para ele”, mas que é “franco” na relação com o governador. Se não pudesse separar o lado pessoal do institucional, Castro já teria seu voto. Mas, se não houver entregas, a população não vai reconhecer e votar para reelegê-lo. Como não há falta de dinheiro, o prefeito conta que disse ao governador que ele “tem que se virar”. “Sinceramente, acho que ele tem dificuldade. Não vejo o governo azeitado para fazer, mas se Deus quiser ele vai conseguir. O governo é muito travado, apesar de que nunca teve dinheiro”, pondera.

Depois do leilão da Cedae, no fim de abril, a administração estadual receberá R$ 14,5 bilhões até 2025. Em Belford Roxo, o prefeito Wagner dos Santos Carneiro, o Waguinho (PSL), também aguarda investimentos do Palácio Guanabara. Afirma estar muito satisfeito com o governo, mas diz que o “entreguismo” – como define o atendimento às necessidades imediatas do eleitor – “é pouco”, seja o da esfera estadual como o da federal.

“Sou apoiador do Cláudio Castro, mas não posso misturar. Cobro muito. Tem que ter entreguismo. Se não tiver, as alianças se tornam fracassadas. O povo hoje sabe cobrar melhor”, diz Waguinho, cuja prefeitura receberá R$ 335 milhões das verbas da Cedae. No total, a concessão da estatal de saneamento distribuirá R$ 22,69 bilhões para o Estado e 28 municípios fluminenses.

Procurado, por meio de sua assessoria, o governador disse que concorda com a avaliação dos prefeitos, pois, como ele mesmo tem afirmado em entrevistas, a viabilidade de sua reeleição depende dele próprio e de sua capacidade de entrega.

Para Waguinho, não vai ser fácil para o Estado e nem para os municípios, converter os recursos da concessão da Cedae em investimentos. Há pouco tempo, argumenta, para a licitação dos projetos, que são de alta complexidade e devem passar pelo crivo de órgãos de controle como os tribunais de contas do Estado (TCE) e da União (TCU), os quais costumam fazer muitas exigências, atrasando o cronograma.

“Tem que ter uma equipe muito boa, técnica, preparada, desenrolada porque os órgãos reguladores são muito exigentes e as leis, a cada dia, estão mais severas. Não vai se encontrar facilidade para correr com essas licitações. Trabalhando com muita dedicação acho que o Estado deva conseguir executar uns 30% [do pretendido]”, diz o prefeito.

Em sua opinião, é possível que, mesmo assim, Castro – ainda desconhecido de grande parte do eleitorado por ter assumido o mandato depois do afastamento e do impeachment de Wilson Witzel (PSC), de quem era vice – tenha sucesso e crie uma marca para sua campanha à reeleição. Mas desde que o governador saiba distribuir bem os investimentos para alcançar a população “nos quatro cantos do Estado”, com ações bem contundentes e onde elas são necessárias, diz, sobretudo na área de saneamento e pavimentação. “Todos os municípios da região são muito carentes, querem o asfalto, o saneamento. Os que moram nas partes altas não querem amarrar a sacolinha [plástica] no pé para descer o morro num dia de chuva, ou não conseguir subir com seus veículos e ter que deixá-los na parte baixa. É o principal clamor da população”, afirma.

Há menos de duas semanas, Waguinho saiu do MDB e filiou-se ao PSL, onde assumiu a presidência do diretório estadual. A legenda tem a segunda maior cota do fundo de campanha e o segundo maior tempo de propaganda no horário eleitoral, o que pode ajudar a turbinar a campanha de Castro em eventual aliança.

Em contrapartida, o prefeito já apresentou uma demanda: ocupar a cobiçada Secretaria de Infraestrutura e Obras, justamente a que ficará responsável por tocar os projetos bilionários com os recursos oriundos da Cedae. Atualmente, o secretário da pasta é o deputado estadual licenciado e ex-prefeito de Queimados, Max Lemos (PSDB). Também ex-emedebista, ele foi derrotado por Rogério Lisboa no ano passado ao tentar se eleger prefeito da vizinha Nova Iguaçu.