Estadão

Notas & Informações
09 de setembro de 2019 | 03h00

Governo e oposição, imersos em concepções reducionistas, não estão preocupados com a realidade e em dar resposta aos problemas reais. O País fica à deriva

Ainda que parte considerável das forças da esquerda queira partir para o revanchismo, em relação tanto ao resultado das urnas como a decisões da Justiça, é cada vez mais evidente que ela não consegue levar adiante o seu intento. O problema não é que a agenda dos partidos de esquerda seja anacrônica – ela é absolutamente incompatível com o temperamento dos brasileiros e com a realidade política e social do País.

O mesmo se pode dizer de outras forças radicais. A direita, por sua vez, tem sido incapaz de ir longe na pregação de seu catecismo fundamentalista. Sua pauta é igualmente retrógrada. Almeja, por exemplo, o retorno a um mundo pretérito, marcado pelas tensões da guerra fria, no qual a sociedade deveria concentrar todos seus esforços para combater o insidioso inimigo, o comunismo. O intento nem ao menos tem o idealismo do Quixote, espetando sua lança no moinho.

O fenômeno que ocorre com as extremas, da esquerda e da direita, tem, no entanto, consequências daninhas para todo o País. Diante do inevitável fracasso de suas respectivas pautas, os apoiadores de cada lado tendem a aumentar seu extremismo, imaginando que a inoperância de suas agendas é causada pela aplicação mitigada ou imperfeita de suas propostas e ideias. Nessa lógica, a solução residiria em aumentar a intensidade do radicalismo – e esta é a melhor receita para extirpar da vida política e social do País qualquer vestígio de racionalidade.

Nessa trajetória de polarização, é frequente que esses grupos persigam parte de seus próprios adeptos, tachando-os de traidores ou desertores. Buscam, assim, apontar uma causa para seu fracasso. Outro subproduto da inoperância das agendas extremistas, como já dissemos, é o recrudescimento do ressentimento de seus membros. Sentem-se profundamente frustrados em seus anseios de encaixar o mundo – o Estado, a sociedade, a família, a empresa, o vizinho, o colega de trabalho – no atraso de sua ideologia.

Tal polarização afasta interlocutores inteligentes e produtivos e leva os grupos militantes à infertilidade dos diálogos consigo mesmos, com drásticos prejuízos políticos, econômicos e sociais para todo o País. Diante desse cenário, impõe-se um diagnóstico lógico e cristalino: os problemas nacionais encontramse desprovidos de resposta. E, caso o debate público continue interditado por grupos militantes extremistas, esses problemas permanecerão sem resposta.

O País precisa urgentemente de caminhos concretos, com propostas de curto, médio e longo prazos, para enfrentar os prementes desafios do crescimento econômico, do emprego, da educação, da saúde, do saneamento e de tantas outras áreas. Essas soluções não virão, no entanto, por passe de mágica. Elas são decorrência do estudo, do diálogo e da negociação – e os grupos militantes extremistas não estão dispostos a percorrer nenhuma dessas etapas. Esse é o grande drama da polarização – inviabiliza as soluções.

A polarização tem atrapalhado o governo do presidente Jair Bolsonaro. É nítida sua dificuldade para apresentar propostas para os problemas reais, bem como para estabelecer com as diversas forças políticas um diálogo capaz de gerar soluções. Ao longo desses oito meses de governo, ele optou por privilegiar uma pauta ideológica, dirigindo sua ação e seu discurso a um grupo cada vez mais restrito de seguidores. Em vez de colocar o seu governo a serviço de todos os brasileiros, o presidente Jair Bolsonaro aninhou-se numa ponta do espectro político, o que causa prejuízos não apenas internamente, mas também nas relações do Brasil com a comunidade internacional.

A população já percebeu esse modo de proceder do presidente Bolsonaro e está cada vez mais insatisfeita, como se vê pelas pesquisas de opinião. Mas a oposição que poderia corrigir os desvios do governo mal existe. Governo e oposição, imersos em suas concepções reducionistas, não estão preocupados com a realidade e muito menos em dar resposta aos problemas reais. O País fica à deriva.