Por Marina Grossi – Valor Econômico

22/01/2019 – 05:00

O ano de 2019 chegou com vários desafios, inúmeros questionamentos e uma certeza: chegaram ao fim os dias em que as empresas e governos poderiam pensar apenas em termos de seus resultados, sem avaliar causas e consequências socioambientais. Mais que isso, os próprios resultados agora dependem diretamente dessa variável. E a situação não é diferente para o poder público ou para a sociedade civil. A questão da sustentabilidade transcende o mundo acadêmico, invade sem cerimônia as principais salas de reunião de executivos, além de ser uma variável competitiva para os países conquistarem melhores posições na nova geopolítica global.

As empresas já perceberam valor nisso e investem. Estudo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) lançado no final de 2018, apontou que suas empresas associadas investiram US$ 85,8 bilhões nos últimos dois anos em medidas que contribuem para a redução de emissões de suas unidades de produção. A maior parte envolveu o uso de tecnologias de eficiência energética, otimização de processos e busca por fontes energéticas de baixo carbono. Juntos, esses projetos foram responsáveis pela redução de 212,1 milhões de tCO2 e no período, o que corresponde a um volume equivalente a 27% da meta total de redução assumida pelo Brasil no Acordo de Paris até 2025.

Sustentabilidade é hoje sinônimo de bons negócios no mundo empresarial e também no político. A boa notícia é que no caso do Brasil já saímos na frente em relação aos outros países. Não só temos ativos ambientais ímpares, como podemos utilizar a própria preservação das nossas florestas como variável de competitividade, tornando-as modelos para o mundo todo, com técnicas avançadas de manejo, já comuns por aqui e pouco conhecidas lá fora. Além disso, temos energias renováveis em abundância e cada vez com custo menor e mais competitivo, sem exigir subsídios e oferecendo oportunidades inúmeras de investimentos.

A sustentabilidade é importante para os países obterem melhores posições na nova geopolítica global Por isso mesmo há uma atenção especial à primeira viagem e primeiro pronunciamento internacional do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, durante a reunião anual do Fórum Econômico Mundial (WEF) em Davos, na Suíça. Ele estará entre três mil tomadores de decisões da política, negócios e ciência. Ao lado do seu superministro da economia, Paulo Guedes, desperta curiosidade sobre o que terá a dizer em relação a políticas de desenvolvimento sustentável do país, cumprimento do Acordo de Paris, combate ao desmatamento e ampliação da exploração da rica biodiversidade nacional.

Elencar as vantagens brasileiras no combate às mudanças climáticas é tão importante quanto apontar as oportunidades de investimentos em saneamento básico. Mostrar ao mundo os esforços que nossas empresas vêm fazendo para aumentar sua eficiência no uso da água, o crescimento da matriz energética renovável, e as boas experiências na abordagem da biodiversidade e do reflorestamento podem atrair investimentos e ajudar a “vender muito bem o País”. Há um gargalo de investimentos em infraestrutura no Brasil, e é a hora de mostrar esse espaço para atrair recursos e mudar cenários que fazem com o que ainda tenhamos um pé no século XIX, como no caso da falta de acesso ao saneamento básico, especialmente nas regiões Norte e Nordeste. E tudo isso é sustentabilidade.

Uma fala internacional em um espaço tão seleto e qualificado como Davos funciona como uma plataforma prática para o Brasil explicar seus planos na área comercial, fiscal, digital, de inovação, de produtividade, desestatização e combate à corrupção. E tudo isso está diretamente conectado à sustentabilidade. Afinal, é ingenuidade pensar que esse conceito não seja utilizado ora como barreira comercial, ora como oportunidade de investimento por governos e empresas para a tomada de decisões.

Cabe ressaltar que as empresas europeias foram as responsáveis por mais da metade dos empregos gerados no Brasil por investimento greenfield de 2006 a 2015. A União Europeia é o segundo maior mercado de produtos agrícolas brasileiros e vêm de lá os principais investidores em infraestrutura nos últimos anos. Por outro lado, sabemos que os negócios gerados a partir da nova economia podem resultar em US$ 26 trilhões na forma de benefícios econômicos até 2030, criando mais de 65 milhões de postos de trabalho e evitando 700 mil mortes prematuras por poluição do ar, segundo análise do New Climate Economy. É preciso conjugar essas premissas com nossas demandas visando um futuro sustentável, que preserve as nossas riquezas naturais, mas que garanta um salto nos indicadores de qualidade de vida da população.

Além disso, temos problemas urgentes a resolver: Os números do desmatamento seguem na contramão do esforço de restauração. De acordo com o Instituto Imazon, a derrubada da floresta cresceu 40% entre agosto de 2017 e julho de 2018.

Em 12 meses, foram perdidos 300 mil hectares – o que se pretende repor no principal projeto de plantio de árvores na Amazônia. Mais do que ativismo ambiental, isso é perda de recursos naturais e financeiros para o Brasil. É preciso pensar em medidas para conter essa sangria.

Não se trata mais de investir em saneamento ou energia renovável; em biodiversidade ou combate ao desmatamento; em reciclagem de lixo ou limpeza dos rios e oceanos; em exploração de petróleo ou reflorestamento. Tudo isso junto faz parte de um universo de possibilidades e novos negócios, sendo feito por empresa, sociedade e governo, e gerando lucros. Não podemos desperdiçar a chance de mostrar ao mundo nosso potencial, o acervo de experiências bem-sucedidas de nossas empresas e as enormes possibilidades de novos negócios que pode ensejar uma visão estratégica aliando desenvolvimento e sustentabilidade.

Marina Grossi é presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) desde 2009 e membro do CPLC (Carbon Pricing Leadership Colalition) do Banco Mundial desde 2018.