Valor Econômico
30/04/2021

Por Maria Silvia Bastos Marques

Ganhos de produtividade serão determinantes para o crescimento no Brasil

Nos últimos 40 anos tivemos duas décadas perdidas, a de 1980 e a que se encerrou em 2020. Entre 2011/20 o Brasil perdeu 8 posições no ranking mundial de PIB per capita, saindo da 77ª para a 85ª colocação. A China que estava no 110º lugar em 2011 ocupa atualmente a posição em que o Brasil se encontrava.

Estamos nos acostumando à mediocridade, repetindo erros de política econômica

Os indicadores do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) elaborado pela OCDE, que medem a habilidade em leitura, matemática e ciência de estudantes com 15 anos de idade, revelam resultados igualmente preocupantes. Em 2018 a pontuação média dos alunos brasileiros foi inferior à dos países da OCDE, sendo que quase metade dos estudantes não apresentou um nível mínimo de conhecimento nas 3 disciplinas.

Nos próximos anos, os ganhos de produtividade serão determinantes para o crescimento no Brasil e, quando examinamos os dados das últimas décadas, também temos razão para nos preocuparmos com o futuro. Em 1985 a produtividade do trabalho (PT) no Brasil, Chile e Coreia do Sul era cerca de 32% da americana, enquanto a chinesa equivalia a apenas 6%. Em 2016 a PT no Brasil caiu para 24% da americana, enquanto a chilena subiu para 46% e a coreana para 61%. A PT chinesa atingiu 19% da americana em 2016 e já deve ter ultrapassado a brasileira.

Os dados da PT por setores no período 1995/2015 também revelam um quadro desanimador. A taxa geral média anual de crescimento foi de ínfimos 0,9% ao ano, sendo que apenas a agricultura apresentou evolução expressiva, de 5,4% ao ano. A taxa de crescimento da PT dos serviços ficou próxima de zero e o desempenho da indústria foi crítico, com a PT caindo em média quase 1% ao ano, apesar do vultoso montante de subsídios alocados ao setor.

O incremento da produtividade se dá pela combinação de mais (e melhor) capital humano e físico e pela eficiência na utilização dos recursos disponíveis. No caso brasileiro a qualidade dos gastos com educação tem ficado muito aquém do necessário, a alocação de recursos públicos teve pouco efeito no aumento do estoque de capital e o arcabouço institucional do país tem prejudicado a utilização eficiente dos fatores de produção. Para revertermos esse quadro e atingirmos o objetivo de sermos um país de renda alta e menor desigualdade social precisamos ter metas, planejamento e prazos. Acima de tudo é necessário ter senso de urgência.

É importante ressaltar que no Brasil temos inúmeros exemplos de casos de sucesso de gestão pública e de investimentos de grande impacto. Para citar alguns, na ciência aplicada a Embrapa, na saúde o SUS, a Fiocruz, o Butantan e a Rede Sarah e na educação o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), bem como escolas nos estados de Pernambuco e Ceará, com estudantes bem classificados no Pisa. Essas boas práticas precisam ser mapeadas pelos governos e usadas como benchmark para as políticas públicas, criando modelos replicáveis, com incentivos/penalidades, cobrança de resultados, métricas e prazos.

Complementarmente, os indicadores do Doing Business, que mostram as boas práticas mundiais, permitem construir planos com ações concretas para tirar o país da vexaminosa situação atual. Ações coordenadas entre o governo federal e os entes subnacionais podem aprimorar o ambiente de negócios no país, ampliando investimentos, empregos e a produtividade da economia.

Concessões de serviços públicos como saneamento, telecomunicações, estradas, portos, aeroportos e ferrovias, são fortes indutores do aumento de produtividade, geram volume significativo de investimentos e de empregos e beneficiam todos os setores. Privatizar empresas estatais, federais e subnacionais, também impacta a produtividade da economia, pois aprimora a governança corporativa, reduz o nível de corrupção no país, aumenta investimento, emprego e arrecadação de tributos (como já verificado em telecomunicações, siderurgia e mineração). Igualmente importante, permite redirecionar o foco dos governos para os serviços públicos essenciais, saúde, educação e segurança pública, bem como para a fiscalização e regulação da atividade econômica, garantindo condições justas de competição e impedindo o surgimento de monopólios ou oligopólios.

Se não agirmos já o Brasil vai continuar retrocedendo em um mundo que caminha célere, à base de inovação, tecnologia e prioridade à utilização sustentável dos recursos naturais, e o preço será pago pelas gerações futuras. As razões de nosso atraso são sabidas, bem como o que é preciso ser feito. No momento que atravessamos, de prolongada crise sanitária e humanitária, que revelou de forma ainda mais crua o quadro de desigualdade social e de desesperança de brasileiros que sequer tentam encontrar uma ocupação, não podemos mais perder tempo. Os desafios dos próximos anos serão prementes, pois será preciso reinserir um enorme contingente de pessoas no mercado de trabalho, oferecer ensino público de qualidade a crianças e jovens e fortalecer o sistema de saúde pública.

Estamos nos acostumando à mediocridade, repetindo erros de política econômica, reduzindo a nossa barra em relação às exigências de qualidade de vida e desempenho de nosso país, o que é inaceitável. Precisamos usar as lições do passado e atacar os problemas no presente para avançarmos em direção ao país que desejamos, com renda alta, menor desigualdade social e qualidade de vida. Somente assim o Brasil finalmente será o país do presente e não o do futuro que nunca chega.

Maria Silvia Bastos Marques foi secretária de Fazenda da cidade do Rio de Janeiro, presidente da CSN, da Icatu Seguros, do BNDES e da Goldman Sachs. É do conselho do CLP.