Valor Econômico

Esta será uma semana decisiva para a relação entre governo e Congresso. O presidente Jair Bolsonaro terá duas opções na mão: ou fecha um acordo para a votação dos vetos sob os termos que já estavam sobre a mesa, pacifica a recente crise com o Parlamento e acalma os protestos prometidos para o próximo dia 15; ou parte para o confronto e corre o risco de não apenas ficar sem os R$ 30 bilhões em disputa no Orçamento impositivo, mas também de fechar todas as portas de negociação com deputados e senadores.

Afinal, é nesta segunda-feira, 2, que Bolsonaro se reunirá com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para discutir se haverá ou não um consenso sobre a votação do veto 52, que trata justamente sobre o Orçamento impositivo. O acordo, que foi fechado na última sessão do Congresso, estará novamente na mesa dos presidentes dos Poderes. Ele prevê, dentre outras coisas, que R$ 11 bilhões irão sair da mão do relator do Orçamento, deputado Domingos Neto (PSD-CE), e voltarão para os ministérios. Uma divisão que agrada ao Parlamento e que tinha sido aceita pelo Planalto.

Lideranças da Câmara não são favoráveis à ideia de alterações neste acordo estabelecido há duas semanas. Elas indicam que o que está em jogo, neste momento, não é apenas o controle do fluxo das emendas impositivas de relator, mas a própria relação com o Congresso. Logo após os vetos saírem da pauta na última sessão conjunta do Parlamento, Domingos Neto avisou que “ficaria insustentável” o diálogo entre Planalto, Câmara e Senado caso os vetos fossem mantidos. Algo que poderia, inclusive, afetar o andamento de projetos previstos para este ano, como as mudanças tributárias.

Rodrigo Maia, como árduo defensor das reformas, sinaliza que irá se desdobrar para apagar o incêndio que o Planalto insiste em alimentar. O presidente da Câmara atuou como bombeiro na recente crise provocada pela “convocação” de Bolsonaro para manifestações contra o Congresso. E mandou sinais de que até topa conversar sobre mudanças no acordo para que esta etapa da discussão seja superada. “Incompreensões e turbulências não vão tirar nem o foco, nem a serenidade dos parlamentares”, disse em seu Twitter.

“Nós estamos trabalhando com a manutenção do acordo”, afirmou ao BRPolítico o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB). “Acredito eu, diante das turbulências do carnaval, seria um gesto importantíssimo que nós tivéssemos a manutenção do acordo, com o governo alinhando, verbalizando que chegou a um consenso com o Congresso”, disse. “Isso seria interpretado como uma retomada do diálogo institucional. Daria para arrefecer o clima, ajuda a aliviar a temperatura das manifestações”, explicou Filho. “Por enquanto trabalhamos com isso, mas o Senado tem surpreendido nas votações.”

Davi Alcolumbre sabe que é justamente em sua Casa Legislativa que reside a maior resistência a um acordo. De um lado, parlamentares próximos ao presidente do Senado e que receberam em 2019 uma gorda fatia de emendas extraorçamentárias proveniente do Orçamento do governo. E que não veem vantagem em comprar briga com o Planalto para deixar R$ 30 bilhões para um deputado distribuir entre possíveis adversários em ano eleitoral.

Por outro lado, nomes como o dos senadores Eduardo Braga (MDB-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL), que possuem influência suficiente para esvaziar ou encher sessões do Congresso, demonstraram irritação com a postura do governo nas últimas semanas. Como, por exemplo, a fala do general Augusto Heleno (ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional), chamando parlamentares de “chantagistas” e as sinalizações enviadas por Bolsonaro de que confia em uma manutenção dos vetos. “Acho pouco provável que haja interesse em um acordo com alguém que nos procura e depois nos chama de chantagista”, disse Braga para a Folha.

Ainda há os membros da oposição, como o líder da minoria no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), e do grupo conhecido como “Muda Senado”. Partidos como o Podemos avisaram que “fecharam questão” pela manutenção dos vetos. E dizem ter inclusive a palavra do ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, de que não haverá acordo pela “divisão” dos recursos.

“Nós falamos com ele na quarta-feira anterior a semana do Carnaval, durante reunião do Podemos. Ficaríamos contrariados com a posição do ministro Ramos caso fosse fechado um acordo”, disse o senador Lasier Martins (Podemos-RS). “Eu acho que a declaração do general Heleno foi imprudente. Mas eu entendo que o presidente não quis fazer ameaça ou intimidação ao Congresso. Ele externou uma palavra de revolta de um administrador da União que está ameaçado de cada vez perder mais recursos”, afirmou.

Bateção de cabeça

A atuação do ministro Ramos, prometendo lutar pela manutenção dos vetos ao mesmo tempo em que diz trabalhar por um acordo, é exemplo da confusa movimentação do Planalto, segundo congressistas. Mensagens difusas chegam do governo aos parlamentares sobre um possível consenso. Os líderes de Bolsonaro no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), e no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), se movimentam para que as relações sejam pacificadas. Mas o presidente da República indica que não abaixará suas armas nessa questão.

O comunicado enviado na última sexta-feira para gabinetes de parlamentares, por exemplo, foi visto como um “tiro de aviso”. A prática de estabelecer limites mensais para as emendas impositivas individuais é recorrente e feita por decreto. Mas a iniciativa da Secretaria de Governo de avisar sobre um “novo limite” não seria comum. Congressistas dizem que foi um “recado”, especialmente para deputados e senadores que não devem ser beneficiados pelas emendas de relator. Um lembrete de que o cofre pode fechar e só ser reaberto após o período eleitoral. O governo é obrigado a pagar as emendas impositivas individuais, mas pode deixar para quitar a maior parte delas no fim do ano. Teria sido acordado que 70% delas seriam pagas antes das eleições.

Outro ponto que irrita parlamentares é a mudança de postura de Bolsonaro e de seu círculo mais próximo. Lembram que o então deputado federal era um árduo defensor do Orçamento impositivo como forma, justamente, de evitar “chantagens” entre Executivo e Legislativo. Seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), discursou no ano passado defendendo a medida e indicando voto favorável à proposta. Segundo o Estadão, o presidente da República irá propor reduzir ainda mais os poderes do relator, mitigando o orçamento impositivo.

Vem mais por aí

O Orçamento é apenas um dos vetos polêmicos que precisam ser discutidos. OBRPolítico listou os principais deles (veja arte abaixo). Por exemplo, precisarão ser votados em breve os vetos ao pacote anticrime, que prometem polêmicas mesmo sem o juiz de garantias ter sido vetado. Atualmente, quatro vetos estão na frente do Orçamento, sobrestando a pauta. Assim, é provável que na próxima terça-feira, quando haverá sessão do Congresso, não seja possível apreciar tudo. Parlamentares já estão contando com uma nova sessão, que seria convocada para próxima quarta-feira, só para tratar do imbróglio orçamentário.

*Colaborou Marcelo de Moraes