Por Gabriel Vasconcelos – Valor Econômico

11/07/2019 – 05:00

Enquanto o governo promete induzir investimentos em infraestrutura, sobretudo para setores estratégicos, como saneamento, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) faz uma análise crítica dos resultados alcançados pelo Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FI-FGTS) em 11 anos de atuação do mecanismo financeiro. Segundo o Ipea, o instrumento criado para alavancar investimentos em infraestrutura tem sido “subutilizado” tanto em volume aportado quanto em relação à natureza das aplicações. Cerca de 42% da carteira do FI-FGTS é de investimentos que nada têm a ver com projetos de infraestrutura. Refere-se, na verdade, a títulos públicos e a papéis de bancos estatais.

A carteira do FI-FGTS chegou a R$ 33,4 bilhões em dezembro de 2017, o último dado obtido pelo Ipea junto à gestora Caixa. Em 2016, o valor da carteira era de R$ 31,7 bilhões. De acordo com o economista Mauro Santos, do Ipea, o valor, assim como a estrutura do fundo, pouco se modificou desde então e representa apenas 6,7% do ativo do FGTS. O FI foi instituído em 2007 a partir de recursos subscritos do patrimônio líquido do FGTS, montante próximo a R$ 100 bilhões nos últimos três anos e desvinculado das contas individuais dos trabalhadores.

Em 2018, o limite de transferência do FGTS para o FI, permitido por lei, foi de R$ 83,5 bilhões, mas o Conselho Curador do FGTS, órgão executivo do fundo para infraestrutura, previu subscrição de apenas R$ 51,6 bilhões. Nada chegou a ser efetivamente desembolsado. Esse cenário se repete desde 2015, quando houve prejuízo de R$ 966 milhões devido principalmente ao desempenho da Sete Brasil, que entrou em recuperação judicial depois de ser envolvida na Operação Lava-Jato.

Neste ínterim, o FI-FGTS parou de receber aportes e teve R$ 3,6 bilhões em resgates de 2016 e 2018. Os aumento do valor aplicado se deve ao reinvestimento de receita própria e mesmo assim a carteira encolheu, após chegar a R$ 37,8 bilhões em 2014. “Há um gap triplo entre o potencial de subscrição, o que o Conselho subscreve e o que de fato aplica. Este é um instrumento que vem sendo subutilizado nos momentos em que precisamos dinamizar projetos de infraestrutura, como agora”, diz Santos.

Segundo ele, a composição da carteira do FI-FGTS também é problemática. Santos questiona a alocação de 21% dos recursos, R$ 6,6 bilhões, em aplicações interfinanceiras de liquidez, quase tudo títulos públicos. Embora apresentem risco baixo e rentabilidade acima da média da carteira, para ele o percentual é excessivo para uma aplicação distante da finalidade. “Por se tratar de um fundo de natureza heterodoxa, com investidor único [o FGTS], não tem porque supor necessidade de liquidez no curto prazo”, diz.

Crítica análoga recai sobre a aquisição de R$ 7 bilhões em debêntures simples emitidas pelo BNDES em 2008 e com vencimento para este ano. A operação ainda representa 11,5% do ativo do FI-FGTS e quase se repetiu recentemente. Nova compra de títulos de dívida do banco, dessa vez de R$ 10 bilhões, chegou a ser aprovada pelo conselho em 2015, mas foi revogada em 2017.

Também é mantido em carteira R$ 1,9 bilhão em ações do Banco do Brasil referentes à execução de garantia de crédito das debêntures emitidas pela Sete Brasil.

O Ipea aponta que, mesmo quando as aplicações respeitam a finalidade do FI-FGTS, elas privilegiam setores com marco regulatório avançado, portanto com mais acesso a crédito. São os casos de empreendimentos do setor de energia, que consomem R$ 10 bilhões do fundo, mais da metade do valor investido em infraestrutura (R$ 18,4 bilhões).