Valor Econômico
10/02/2021

Por Marta Watanabe

Crescimento é de 10,8% graças a transferência de recursos

O pacote de ajuda da União aos governos regionais para fazer jus aos efeitos econômicos da pandemia contribuiu para que Estados tivessem recursos disponíveis para investimentos. Mesmo com uma arrecadação própria agregada que cresceu apenas 2% nominais em 2020, abaixo da inflação de 4,5% no ano, os investimentos do conjunto dos 27 entes federados avançaram 10,8% nominais contra o ano anterior. Em 13 Estados a variação ficou acima de 20% e em dez deles a alta superou os 30%.

Foram de grande ajuda as transferências da União, que subiram 36,2% incluindo na conta os repasses extraordinários realizados por conta da pandemia, o que permitiu à receita corrente crescer em ritmo mais forte que a arrecadação própria, com alta de 6,6% nominais no conjunto dos 26 Estados mais o Distrito Federal. Com a dedução dos R$ 6,4 bilhões pagos pelo governo federal aos Estados relativos ao leilão da cessão onerosa do pré-sal na base de 2019, a expansão nominal das transferências da União foi de 43,1%.

Outra grande ajuda do pacote da União se deu pelo lado das despesas, com a suspensão por seis meses dos pagamentos de amortização e juros da dívida com o governo federal. No ano passado, a despesa com amortização de dívida dos Estados caiu 23,3%, sempre com variações nominais.

Nem todos os Estados, porém, elevaram os investimentos no segundo ano de mandato dos governadores. Entre as exceções ficaram Paraíba, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro (Ver quadro ao lado).

Os dados foram levantados pelo Valor nos relatórios de execução orçamentária entregues pelos Estados à Secretaria do Tesouro Nacional. Foi considerada como arrecadação própria o recolhimento de impostos, contribuições e taxas. Nas despesas, foram comparados os valores empenhados.

A economista Ana Carla Abrão, sócia da Oliver Wyman, diz que os números mostram para parte dos entes o melhor cenário em muitos anos. “Mas são resultado de uma quadro conjuntural excepcional e pode mascarar uma situação estruturalmente desequilibrada nos Estados que não têm feito a lição de casa.”

Como a proibição aos Estados à criação de novas despesas de pessoal estabelecidas pela Lei Complementar 173/2020 – uma das leque estabeleceu medidas de socorro da União – cessam ao fim de 2021 e no próximo ano haverá eleições, a preocupação, diz Ana Carla, é de que suba a pressão por aumento de gastos, agravando o desequilíbrio. Já há, diz, sinais dessas pressões.

Entre os Estados que aumentaram os investimentos no ano passado, saúde e infraestrutura estão são as áreas mais relatadas por representantes de Estados.

Rogelio Pegoretti, secretário de Fazenda do Espírito Santo, explica que no ano passado o Estado recebeu R$ 900 milhões a menos do que estava previsto no orçamento em royalties e participação de petróleo, mas essa frustração foi compensada em grande parte pelas transferências extraordinárias do governo federal. A receita de royalties e participações especiais do petróleo já chegou a representar 15% do orçamento capixaba. As receitas correntes do Estado encerraram 2020 com queda nominal de 0,6%, o que foi considerado um resultado bom frente às perspectivas da fase mas aguda da pandemia no ano passado.

Os investimentos do Estado, que somaram R$ 1,5 bilhão em 2020, com avanço de 39,5% contra 2019, foram garantidos, aponta Pegoretti, principalmente por recursos do fundo estadual de infraestrutura montado anteriormente com receitas extraordinárias, como da unificação de campos de petróleo e da cessão onerosa.

“As obras foram mantidas no ano passado, assim como o nível de investimentos planejado”, diz Pegoretti. O fundo de infraestrutura, diz ele, tem ainda saldo de R$ 930 milhões. No ano passado, lembra, além de obras viárias, a saúde também teve recebeu grande volume de investimentos. A estratégia, diz, foi investir na ampliação de capacidade permanente de atendimento da saúde em vez de montar hospitais de campanha para atender os casos de covid-19. A estratégia foi importante na segunda onda, já que o Estado não precisou desmontar e remontar esses hospitais de campanha.

Em relação a 2021, diz ele, ainda há muita incerteza sobre a evolução da economia em razão da indefinição sobre o auxílio emergencial e da vacinação.

René Garcia, secretário de Fazenda do Paraná, tem preocupação semelhante. No ano passado, lembra, com a suspensão da dívida, R$ 600 milhões deixaram de ser pagos pelo Estado à União.

Isso, mais os repasses extras do governo federal, diz, permitiram ao Estado fechar o ano passado com disponibilidade de caixa de R$ 1,7 bilhão, o que deve ajudar a fazer frente, pelo menos durante o primeiro trimestre, às “intempéries”, como gastos maiores na saúde, por exemplo. A arrecadação própria do Estado aumentou 0,7% nominais em 2020, mas com os repasses extras da União o total da receita de transferências correntes aumentou 25,9%. Isso contribuiu para as receitas correntes fecharem com alta de 5,2%.

Os recursos economizados com o pagamento da dívida, diz ele, permitiram no ano passado aplicações maiores na saúde e assistência social. Os investimentos, que somaram R$ 3,1 bilhões, com aumento de 20,9% em 2020, diz ele, foram financiados com o superávit financeiro de R$ 2 bilhões obtidos em 2019, além de recursos para empréstimos.

Em Alagoas, diz o secretário de Fazenda George Santoro, o auxílio emergencial aos mais vulneráveis elevou a arrecadação própria. “O efeito foi diferente entre os Estados. Em Alagoas, onde a base de arrecadação de ICMS é muito baseada em consumo, o impacto positivo foi grande”, diz. O Estado teve desempenho melhor que a média na arrecadação própria em 2020, com alta de 7,2% nominais na comparação com 2019. Com a ajuda dos repasses extras da União, as receitas correntes avançaram 20% e os investimentos alcançaram R$ 1 bilhão, montante 23,8% maior do que o de 2019.

Valores equivalentes aos R$ 440 milhões em repasses extras da União em 2020, diz ele, ficaram praticamente livres e geraram superávit financeiro ao fim do ano. Isso juntamente, com a redução de despesa da dívida com a União, resultou em R$ 740 milhões em recursos disponíveis ao Estado somente com essas duas medidas.

No Rio Grande do Sul, o secretário de Fazenda Marco Aurelio Cardoso explica que a ajuda da União contribuiu para que o Estado fechasse o ano passado com déficit orçamentário de R$ 597 milhões, um sexto do rombo de 2019. Candidato à adesão ao novo programa de recuperação fiscal aprovado em âmbito federal, o Estado tem comemorado há dois meses o pagamento em dia dos salários de seus servidores, após mais de quatro anos com atrasos.

Cardoso diz, porém, que o resultado de 2020 também deve ser creditado às reformas administrativa e previdenciária que o Estado aprovou em 2019. Isso permitiu ao Estado reduzir de R$ 12,4 bilhões para R$ 10,3 bilhões o déficit previdenciário. As despesas correntes caíram0,12% em termos nominais em 2010 em relação ao ano anterior, apesar da elevação de 18% nos gastos com saúde. Com ajuda das transferências da União, as receitas correntes do Estado aumentaram 5,4%. Os investimentos subiram 3,2%.