Por Fernando Torres – Valor Econômico

22/07/2019 – 05:00

A oferta de ações da BR Distribuidora pela Petrobras, que deve ter o preço fechado amanhã, pode elevar o volume de venda de ações na bolsa por parte do setor público para mais de R$ 33 bilhões desde outubro, conforme cálculos do Valor Investe.

Até agora, o governo federal e suas estatais se desfizeram de cerca de R$ 22,9 bilhões em participações acionárias bolsa, seja diretamente no mercado ou em ofertas organizadas – como a saída da Caixa do capital votante da Petrobras, a listagem da Neoenergia e mais recentemente a venda de ações do IRB. Se o novo presidente do BNDES, Gustavo Montezano, cumprir a missão que lhe foi delegada, há pelo mais outros R$ 100 bilhões em participações a serem vendidas, o que já deixa alguns investidores preocupados.

Não que a redução do peso estatal no mercado acionário seja vista com maus olhos por agentes privados do mercado de capitais. Pelo contrário. A questão tem a ver com a capacidade de absorção de um volume muito grande de vendas em um período relativamente curto.

Mesmo antes de Paulo Guedes assumir o comando da Economia – mas já depois da eleição de Jair Bolsonaro -, tanto a Caixa Econômica Federal quando a BNDESPar iniciaram a venda de ações preferenciais da Petrobras no último trimestre de 2018, movimentando cerca de R$ 870 milhões. Após a virada do ano, as vendas se intensificaram e a BNDESPar, sozinha, se desfez de mais R$ 3,7 bilhões da estatal de petróleo no primeiro trimestre, conforme dados de balanço. No mês de maio, foi a vez de a Caixa vender R$ 7,3 bilhões em ações ordinárias da Petrobras em oferta pública.

Depois disso, houve a abertura de capital da Neoenergia, em que o Banco do Brasil entrou como um dos vendedores e levantou quase R$ 1,8 bilhão. Na semana passada, o BB se desfez de mais R$ 4,2 bilhões em papéis do IRB, e a própria União deixou o capital da resseguradora, vendendo R$ 3,2 bilhões.

Em recente evento da XP Investimentos, o sócio-fundador da JGP André Jakurski mencionou o risco de oferta excessiva por parte do governo em um curto período ao comentar que, quando a Caixa vendeu ações da Petrobras, “já teve uma cambaleada” nos preços. “Se vier o BNDES com outros R$ 55 bilhões [se referindo ao valor da fatia direta e indireta do banco na companhia], talvez seja o caso de esperar para comprar de volta depois.”

Em sua posse, na semana passada, o novo presidente do BNDES colocou a aceleração da venda de participações como sua segunda meta, logo atrás do objetivo de explicar a suposta “caixa-preta” que diz existir na instituição. Aos jornalistas, contudo, fez algumas ponderações. “Nenhum desinvestimento é independente do valor do ativo”, disse, conforme reportagem do Valor.

A ideia, disse ele, é vender as ações em momentos de preços mais altos. No entanto, o próprio executivo ponderou que o direcionamento desses recursos para áreas com alto retorno social, como saneamento, pode em alguns casos trazer mais benefícios para a sociedade do que o lucro que o BNDES teria com a venda de ações em um momento mais favorável.

Em relação à oferta da BR Distribuidora, a principal dúvida que paira sobre os investidores é sobre como será a gestão da companhia, uma vez que ela deixará de ser formalmente uma estatal, mas seguirá tendo a Petrobras como sua acionista mais relevante, com sua fatia no capital diminuindo de 71,25% para 45,25% ou até 38%, a depender da venda de lotes extras na operação. A depender desse volume, a transação deve gerar de R$ 7,7 bilhões a R$ 10,4 bilhões para a Petrobras.

Para as pessoas físicas, é bom lembrar, o período de reserva para comprar papéis da BR termina hoje e a aplicação mínima é de R$ 1 mil. Já os investidores institucionais têm até terça para manifestar o desejo de comprar os papéis. Como a companhia já tem ações listadas, sempre existe a opção de compra na bolsa (e não na oferta organizada).

Blogueiro do Valor Investe, o analista de ações André Rocha pondera que as concorrentes da BR na bolsa – Ultrapar, dona da rede Ipiranga, e Cosan, que tem uma joint-venture com a Shell na distribuição de combustíveis no país – têm se mostrado mais eficientes no segmento.

Em tese, portanto, se a BR Distribuidora, uma vez sendo privada, conseguir alcançar as margens operacionais das rivais, isso poderia beneficiar suas ações, que hoje são negociadas com desconto ante às das concorrentes.

Porém, existem dúvidas sobre essa mudança na gestão. A casa de análise Eleven Financial, por exemplo, pontua que não se sabe como ficará a governança da empresa após oferta e, em relação ao próprio negócio de distribuição de combustíveis, cita que os volumes de vendas dependem do ritmo de atividade econômica (que não anda bem), e aponta como ponto de atenção a dependência da política de preços da Petrobras, além da suscetibilidade à concorrência com o combustível importado pelos postos de combustíveis de bandeira branca.