Valor Econômico
23/01/2020

A desigualdade foi um dos temas recorrentes na reunião deste ano do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. O fórum começou, na terça-feira, já sob o impacto de dois novos relatórios nada auspiciosos a respeito do assunto, um deles da rede de organizações não-governamentais Oxfam, e outro da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A Oxfam constatou, dramaticamente, que “a desigualdade econômica está fora de controle”, depois de calcular que apenas 2.153 bilionários detêm mais riqueza do que 60% da população mundial, o equivalente a 4,6 bilhões de pessoas. Mais do que isso, 22 deles possuem mais dinheiro do que todas as mulheres da África juntas.

Já a OIT salientou que, apesar do desemprego estar relativamente baixo na média mundial, em 5,4%, muitas pessoas estão no trabalho informal. Segundo a organização, somam 188 milhões os desempregados no mundo, dos quais 12 milhões no Brasil. Outras 165 milhões de pessoas têm emprego, mas gostariam de trabalhar mais; e 120 milhões não são considerados desempregadas, mas só marginalmente vinculadas ao mercado de trabalho. E há cerca de 2 bilhões de trabalhadores informais, 61% da força de trabalho mundial.

Em termos de salário, que tem impacto direto na desigualdade, mais de 630 milhões de trabalhadores no mundo continuam vivendo na pobreza extrema ou moderada, que a OIT define quando se recebe menos de US$ 3,2 por dia em termos de paridade de poder de compra. Além disso, a renda do trabalho diminuiu para o equivalente a 51% dos ganhos dos detentores de capital, abaixo dos 54% de 2004.

Na análise da organização, tensões comerciais e geopolíticas deprimem a confiança de empresários e investidores, influenciando negativamente as cadeias globais de produção.

Não foram apontadas soluções novas para o problema. A Oxfam voltou ao tema da tributação de fortunas. Enquanto os salários médios cresceram 3% de 2011 a 2017 nos países do G-7, os dividendos para acionistas saltaram 31%. Nos mercados emergentes a diferença deve ter sido ainda maior. Segundo a associação, apenas 4% das receitas tributárias globais provêm da taxação de fortunas, e a evasão fiscal escamoteia 30% da renda dos muitos ricos.

O próprio Fórum Econômico Mundial divulgou estudo que projeta ganho de até 4,4% no PIB global caso as economias dessem oportunidades iguais a seus cidadãos. Levando em conta salários, sistema de proteção social, condições de trabalho e educação continuada, a lista dos dez países entre 82 analisados com maior mobilidade social no mundo engloba somente os europeus Dinamarca, Noruega, Finlândia, Suécia, Islândia, Holanda, Suíça, Áustria, Bélgica e Luxemburgo. Os Estados Unidos aparecem em 27º lugar; e o Brasil está na 60ª posição.

Perguntado em um painel, em Davos, a respeito do que o Brasil estava fazendo para combater a desigualdade e apoiar os jovens, o ministro da Economia, Paulo Guedes, avaliou que a desigualdade de renda tem duas origens principais no país. A primeira delas é a educação deficiente, que dificulta o acesso dos jovens de origem pobre aos bons empregos; e a segunda, a falta de competição no mercado interno. Segundo o ministro, países asiáticos que evoluíram economicamente, como a Coreia e o Vietnã, investiram na educação em seus primeiros estágios e abriram seus mercados. Sem dar detalhes, Guedes informou que o governo vai apoiar um “gigantesco [programa de] vouchers para educação nos primeiros estágios” (Valor 22/1). Disse ainda que a reforma da Previdência aprovada no ano passado foi totalmente focada nos jovens, e lembrou a agenda de desoneração de salários para a contratação de jovens. Em relação aos mercados, reclamou que “temos cartéis para todos os lados porque não gostamos do capitalismo, odiamos competição”.

Guedes não acenou com nada mais direto em relação ao mercado de trabalho. Não falou em programas sociais, reconhecidos como eficientes para reduzir a desigualdade até pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). A preocupação do ministro com a educação “nos primeiros estágios” chama a atenção uma vez que é responsabilidade das autoridades municipais. Além disso, sabe-se que o principal problema da educação no país está no ensino médio, cujas deficiências provocam evasão e resultam no fraco desempenho dos jovens nos exames internacionais.