Valor Econômico
Por Rodrigo Carro e Taís Hirata

03/05/2021

Três blocos arrematados por um total de R$ 22,7 bilhões englobam 11 milhões de habitantes

O leilão de concessões da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) altera drasticamente o panorama do saneamento básico no país, com um aumento de 32% na população beneficiada por investimentos da iniciativa privada. Em termos de investimentos comprometidos, o patamar de desembolsos projetado para o setor privado no setor salta de quase R$ 48 bilhões para mais de R$ 75 bilhões com os três blocos de municípios fluminenses arrematados na última sexta-feira.

A Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon) contabilizava 30,4 milhões de brasileiros em municípios atendidos por operadores privados de saneamento em 2018. De lá para cá, licitações realizadas em Alagoas, nos municípios capixabas de Cariacica e Viana, e no Mato Grosso do Sul elevaram esse total para pouco mais de 34 milhões de habitantes beneficiados. Só o leilão de concessões de serviços da Cedae significa um acréscimo de mais 11 milhões de pessoas, alta de 32,3%.

Realizada na B3, a licitação terminou com uma arrecadação total de R$ 22,7 bilhões em outorgas. Os investimentos contratados somam R$ 27,1 bilhões. Esse montante corresponde a mais da metade de todo investimento comprometido do setor privado em saneamento até o leilão (R$ 48 bilhões). “Houve uma mudança de padrão, em termos de escala, no setor de saneamento”, resume Percy Soares Neto, diretor executivo da Abcon.

A Aegea Saneamento foi a principal vencedora do leilão da Cedae. O grupo ficou com os lotes 1 (Zona Sul da capital e outras 18 cidades) e o lote 4 (Centro e Zona Norte da capital, além de oito cidades do Estado).

A companhia participou da disputa em consórcio com seus próprios acionistas: a Equipav (que detém 70,72% do capital da empresa), o fundo soberano de Singapura, GIC (19,08%) e a Itaúsa (10,2%). Esta última anunciou sua entrada na empresa no início da semana passada, já indicando que o grupo seria agressivo em suas propostas no leilão.

Ao todo, o consórcio se comprometeu a pagar R$ 15,4 bilhões em outorgas, nos dois blocos adquiridos. Além disso, os contratos demandarão investimentos de R$ 24,3 bilhões, que serão aplicados ao longo do contrato de 35 anos, mas terão uma forte concentração nos 12 primeiros anos, devido à exigência de universalização dos serviços dentro desse prazo.

O consórcio da Iguá Saneamento, que incluiu a Sabesp com fatia minoritária, ficou com o Bloco 2, que abarca a Barra da Tijuca, Jacarepaguá e as cidades de Miguel Pereira e Paty do Alferes. A empresa ofereceu outorga de R$ 7,3 bilhões pelo contrato, e fará aportes de R$ 2,8 bilhões.

Os recursos virão do caixa da empresa, de um aporte adicional dos acionistas – principalmente dos fundos de pensão canadenses Canada Pension Plan Investment Board (CPPIB) e Alberta Investment Management Corporation (AIMCo) -, e de financiamento. A empresa já tem um empréstimo-ponte, negociado previamente ao leilão, até a contratação dos instrumentos definitivos, com o BNDES.

Tal como no caso da Aegea, a Iguá teve a entrada de um acionista de peso antes do leilão, o CPPIB, que adquiriu fatia de 45% no capital em março. A operadora é controlada pela gestora IG4 Capital, de Paulo Mattos, que em 2017 comprou a companhia – então chamada CAB Ambiental – do grupo Galvão.

“A área do bloco 2 é concentrada em poucos bairros e municípios, o que vai permitir uma aceleração da captura de resultados, da redução de custos e do aumento de receita. Vemos muito valor nesse lote. Conhecemos a realidade do Rio, a estrutura da Cedae e julgamos nossa oferta adequada. Na nossa preparação, ainda havia espaço para avançar ainda mais na proposta da outorga, caso houvesse disputa por viva-voz”, disse o presidente da Iguá, Carlos Brandão.

á o leilão do Bloco 3, que contempla a Zona Oeste do Rio e outras seis cidades, terminou sem interessados. A Aegea havia entregado proposta pelo lote, mas retirou sua oferta após a conquista dos outros dois contratos, que foram licitados antes.

Com isso, o governo do Rio de Janeiro já planeja fazer uma nova licitação com o Bloco 3, possivelmente agregando municípios que não fizeram parte do leilão da sexta-feira, afirmou o secretário do Estado da Casa Civil do Rio de Janeiro, Nicola Miccione.

O diretor de Infraestrutura, Concessões e Parcerias Público-Privadas do BNDES, Fábio Abrahão, afirmou que, se houver interesse do governo fluminense, o Bloco 3 poderá ser relicitado ainda neste ano. Mesmo com o fracasso em um dos lotes, o leilão foi muito comemorado pelo BNDES, que vinha trabalhando no projeto há quase quatro anos, em meio a uma série de resistências e embates judiciais. Nesse período, a equipe foi assessorada pelo Banco Fator, pelo escritório Vernalha Pereira Advogados e pela Concremat.