Valor Econômico
03/12/2019

Por Alex Ribeiro, Flávia Furlan e Talita Moreira

Às vésperas do período de silêncio, presidente do BC não abordou a sinalização para a trajetória de juros

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse ontem que parte da pressão recente no mercado de câmbio reflete uma etapa do processo de convergência da economia brasileira a padrões mais avançados, depois de ficar estagnada na armadilha da renda média.

Segundo ele, a queda estrutural de juros na economia leva primeiro à saída de investimentos de curto prazo em renda fixa, mas apenas num momento seguinte o país se tornará mais atrativo para projetos de investimento na economia real.

“A gente tinha uma renda fixa que era muito atraente para o investidor estrangeiro”, disse Campos, em apresentação no almoço de fim de ano da Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Ele se refere a fluxo de investimentos estrangeiros que era atraído pelos altos juros no Brasil, que entre 2015 e 2016 chegaram 14,25% ao ano.

“Na hora que você começa a ter um juro mais baixo, o investimento mais especulativo deixa de entrar no país”, seguiu Campos. Hoje, os juros básicos da economia estão em 5% ao ano e, pelas expectativas do mercado financeiro, devem ser reduzidos pelo BC a 4,5% ao ano na semana que vem.

Às vésperas do período de silêncio do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, que começa nesta quarta-feira, Campos não abordou a sinalização para a trajetória de juros feita para reunião dos dias 10 e 11 de dezembro.

Campos previu que, depois da saída do investimento especulativo, deve ingressar o investimento produtivo “Eventualmente, isso acarreta que a atividade real comece a surgir. Então você começa a ver o fluxo real”, disse o presidente do BC. “É muito importante continuar avançando nas reformas, porque identificamos que no ano que vem tem um fluxo grande para entrar da parte real”, disse ele.

De agosto a novembro, até o dia 21, investidores estrangeiros retiraram do país mais de US$ 10 bilhões, em termos líquidos, em investimentos que estavam aplicados em títulos de renda fixa negociados no mercado doméstico.

Mas os investimentos ligados à atividade real da economia têm decepcionado no mesmo período. Os investimentos em carteira, incluindo ações e fundos de investimento, registram uma saída de US$ 5,5 bilhões. Já o investimento direto segue estável em torno de US$ 80 bilhões, nos dados acumulados em 12 meses.

Campos previu uma recuperação dos investimentos produtivos em infraestrutura, em áreas como saneamento básico e logística, além do fluxo que já vem ocorrendo no segmento de energia, como linhas de transmissão.

Ele também voltou a citar outros fatores que estão causando pressão na taxa de câmbio, que chegou a uma máxima de R$ 4,27 na semana passada e levou o Banco Central a intervir no mercado. Ontem, o dólar fechou com queda de 0,64%, a R$ 4,2127.

Campos disse que empresas estão pagando dívida externa para captar no mercado doméstico. “As companhias preferem ter dívida local mesmo que mais cara para não ter descasamento de balanço”, afirmou. Ele ponderou que esse processo tende a ter prosseguimento, na mediada em que a curva de juros de longo prazo está mais baixa, refletindo a melhora na perspectiva fiscal do país. O Banco Central está conduzindo estudos para mensurar o volume de pré-pagamento de dívidas com a queda da curva de juros futuros.

O presidente do BC citou também entre os fatores que pressionaram o câmbio a frustração dos mercados com o ingresso abaixo do esperado no leilão da cessão onerosa, além de um ambiente de fortalecimento do dólar em escala mundial. Na palestra, ele disse que o período de juros baixos no mundo levou ao acúmulo de riscos financeiros, mas sustentou que o Brasil está preparado para enfrentar eventuais choques externos.