Aesbe entra com ação contra impossibilidade de firmar contratos de programa para o serviço de saneamento

Entidade alega que trecho do novo marco regulatório é inconstitucional

A Aesbe protocolou uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI6882) contra um dispositivo da Lei nº 14.026/2020.  O processo, encaminhado para o Supremo Tribunal Federal, diz respeito ao artigo 16, que veda a celebração de contratos de programa para os serviços de saneamento básico.

No projeto de lei original, aprovado pelo Congresso Nacional, as cidades podiam firmar acordos diretamente com as estatais de água e esgoto, por meio de contrato de programa, sem concorrência. Com a impossibilidade de acordo entre as partes, isso não poderá mais ocorrer.

Na ação, a entidade entendeu que a legislação fere a Constituição Federal, em especial o art. 241, que estabelece que a prestação de serviços públicos, inclusive os de saneamento básico, pode ser realizada diretamente pelo poder público (de maneira centralizada ou descentralizada), indireta, por concessão (licitação) ou por consórcio público. “Ao permitir essas possibilidades, a Constituição Federal confere à concedente o poder e o dever de escolher uma das formas de exercer o serviço público.Esse poder de decisão não está previsto na legislação, que está impedindo o município de executar uma ação que a constituição não só autoriza como preconiza, sendo também eventualmente incentivada aos municípios.Ou seja, a legislação federal revogou a constituição”, diz o advogado Cezar Eduardo Ziliotto, responsável pela ação.

Outro entendimento inconstitucional é de que o marco legal veta os contratos de programa apenas no saneamento –e não nos demais serviços públicos. “Foi criada uma restrição via lei ordinária para o texto constitucional, que não seria adequada, pois a lei dá eficácia e aplicação à constituição – e não a altera,como aconteceu agora. Além disso, ela interfere na autonomia dos municípios”, afirma o advogado.

Para André Luis Pereira Oliveira, coordenador da Câmara Técnica Jurídica (CTJ) da Aesbe, o marco legal promove avanços para o país, mas em alguns pontos específicos, ela fere a Constituição Federal.  “Reconhecemos que o Novo Marco Legal do Saneamento trouxe avanços e promoveu alterações que são bastante salutares para o desenvolvimento do saneamento no país. Porém, a ADI proposta pela Aesbe  tem como foco alguns pontos específicos da Lei n.º 14.026/2020, cuja inconstitucionalidade já vem sendo destacada por nós desde o início da tramitação do PL no Congresso Nacional. O ponto mais sensível e elemento nuclear de nossa investida junto ao STF é a tentativa de se limitar, por meio de uma norma infraconstitucional, uma prerrogativa que é expressamente prevista em nossa Carta Magna, qual seja: a constituição da gestão associada”, afirma .

A ação cita o caso do estado do Paraná, em que ocorreu a situação inversa, na qual os municípios estavam impossibilitados de decidir por licitar. A determinação  foi declarada como inconstitucional por ofensa a autonomia municipal. “O estado quis limitar mais uma ferramenta que municípios têm para poder firmar contrato, tirando a parcela da autonomia dos municípios de decidir sobre a forma de prestação do serviço de saneamento básico”, diz outro representante da Câmara Técnica Jurídica da Aesbe.

Segurança jurídica

A ação destaca que as associadas atendem 4.013 municípios dos 5.500 do país, alcançando quase 130 milhões de habitantes, e têm o papel de reduzir as desigualdades nacionais, estaduais e locais, garantindo o mínimo de dignidade às populações atendidas. “A medida tem como finalidade não só evitar o prejuízo à sociedade como manter a motricidade das companhias estaduais. A lei 14.026/2020, por si só, ocasiona embaraço às atividades das empresas públicas, a ponto de colocar em risco a viabilidade e a possibilidade de elas continuarem operando a longo prazo”, destaca Ziliotto.

A ação ressalta que a situação acarretará severos danos à economia e à saúde pública, além de ferir de morte a segurança jurídica, que é tão importante para a população. “Criam confusão no planejamento do saneamento, uma área que necessita de previsibilidade e investimentos altos a longo prazo.Com isso, ao invés de causarem benefícios, entendemos que trazem prejuízos”, analisa o advogado.

Próximos passos

A Aesbe e as associadas aguardam a apreciação. No site do Supremo Tribunal Federal, consta que a ADI foi distribuída ao ministro Luiz Fux. Além do pedido de inconstitucionalidade à lei federal, a ação requer que, desde já, os dispositivos sejam suspensos até que seja julgado o mérito da ação, garantindo que os entes federados possam continuar a prestar os serviços habituais.  “Este é um tema que faz parte do nosso dia a dia profissional nos últimos anos, cujo debate se encontra maduro e que tem caráter exclusivamente técnico-jurídico. Temos muita confiança na análise a ser realizada pelo Pretório Excelso e seguimos firmes e crédulos no êxito da ADI”, finaliza o coordenador da CTJ.

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