Valor Econômico
08/04/2021

Por Cristian Klein e Rodrigo Carro

Legislativo fluminense resolve esperar para votar projeto que suspende leilão da Cedae em 30 de abril

Depois de esticar a corda e ameaçar aprovar um projeto que suspende a concessão de serviços da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) à iniciativa privada, em leilão marcado para o dia 30, o Legislativo fluminense resolveu esperar, até as vésperas da licitação, por uma decisão favorável do governo federal sobre as novas regras de adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF).

A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) informou ontem em nota ao Valor que a regulamentação da Lei Complementar nº 178, a qual estabelece as bases para o novo RRF, deverá ser publicada ainda neste mês. Na véspera, em posicionamento enviado por e-mail, a assessoria de imprensa do Ministério da Economia havia informado que a expectativa era que a regulamentação fosse publicada “até o início de maio.”

Em resposta, o presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), André Ceciliano (PT), afirmou que colocaria o projeto hoje para votação. A decisão foi reavaliada diante da percepção de que o Ministério da Economia está se mobilizando para atender a demanda. A regulamentação e a assinatura de um novo regime passaram a ser objeto de barganha para a realização do leilão.

O deputado é autor do projeto de decreto legislativo que suspende o leilão da estatal de saneamento enquanto não for garantida ao Rio de Janeiro a manutenção de regras mais favoráveis no RRF.

De acordo com o Tesouro, a regulamentação foi encaminhada à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), onde se encontra sob prioridade de análise. “A parte relacionada ao RRF seria regulamentada por um decreto, e a expectativa do Ministério da Economia é que ele seja publicado ainda em abril”, diz a nota.

Fonte que acompanha o processo de perto informou que o decreto passaria ontem pelo crivo da PGFN, o que permitiria ao ministro Paulo Guedes assiná-lo ainda hoje. “Está tudo pronto. Não há motivo para a regulamentação não sair rápido”, resume a fonte, sob a condição de anonimato. “Quando sai do ministro, um assunto como esse, vai lá para a Presidência da República, para a Secretaria de Governo, e normalmente leva uma semana”, acrescenta.

Dentro do cronograma esperado pela fonte, a sanção presidencial poderia ocorrer já na próxima semana, o que abriria as portas para o Rio de Janeiro e outros Estados aderirem ao novo regime.

Com a nova perspectiva de regulamentação da Lei Complementar nº 178, Ceciliano afirmou ao Valor que seu projeto entrará em pauta na sessão de hoje, receberá emendas mas não será votado. A proposta sairá de pauta e só retornará para votação no dia 22 ou 27, dando tempo para que se solucione o imbróglio com o governo federal.

O projeto que suspende a concessão dos serviços de distribuição de água e tratamento de esgoto da Cedae foi apresentado como forma de forçar o Ministério da Economia a regulamentar a LC 178, sancionada em janeiro. A lei complementar abre caminho para a assinatura de um novo Regime de Recuperação Fiscal (RRF), com a renegociação das dívidas do Estado com a União. “Se até lá o governo federal assinar o RRF, o projeto não volta à pauta e perde objeto com a realização do leilão”, diz Ceciliano.

Duas emendas já foram apresentadas pelo deputado Luiz Paulo (Cidadania) e seria possível votar o projeto hoje, mas a retirada de pauta é uma decisão política, segundo Ceciliano, com o intuito de receber a resposta esperada do governo federal e se encerrar o assunto.

Para o presidente da Assembleia, se o imbróglio resultar em prejuízo para a realização do leilão, com incertezas às vésperas da data marcada, isso será de responsabilidade do Ministério da Economia. “A bola não está com a gente, está com o governo federal, que não pode ficar cinco meses para regulamentar uma lei, a não ser que não queira que ela vigore”, diz.

O leilão de concessões dos serviços de distribuição de água e coleta e tratamento de esgoto da Cedae engloba 35 municípios fluminenses, distribuídos em quatro blocos. O investimento total previsto ao longo de 35 anos de concessão está estimado em cerca de R$ 30 bilhões. A outorga mínima total, para os quatro blocos, é de R$ 10,6 bilhões.

“Esse é um pedido de ajuda do governo do Estado que fez isso usando a assembleia para não esgarçar a relação com o Poder Executivo federal”, sustenta a fonte que pediu para não ter seu nome divulgado. Se a intenção fosse simplesmente impedir o leilão, argumenta a fonte, o projeto de decreto legislativo seria apresentado e votado dias antes do leilão, deixando pouco tempo para a reação do Ministério da Economia.