Por Valor Econômico

22/01/2019 – 05:00

Nem bem o ano começou e uma romaria de governadores foi a Brasília buscar ajuda federal para equilibrar suas contas. Os recém empossados governantes de Goiás, Mato Grosso e Pará estiveram pessoalmente no Ministério da Economia e Tesouro para negociar. Mato Grosso decretou estado de calamidade financeira na expectativa de conseguir parcelamento para pagar suas dívidas. Anteriormente neste ano, Roraima e Rio Grande do Norte haviam feito o mesmo. Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais declararam estado de calamidade há quase três anos, em 2016. A dívida dos seis Estados soma R$ 247,9 bilhões, segundo informações do Tesouro Nacional.

Quem acompanhou as reportagens publicadas pelo Valor ao longo de 2018 não se surpreende. O crescimento dos gastos em ritmo superior à expansão das receitas é o principal problema, alimentado principalmente pelas folhas de salários inchadas. A recessão econômica brecou a arrecadação ao mesmo tempo em que ampliou a demanda por serviços públicos, especialmente de saúde e educação. Agravou o quadro o aumento dos empréstimos entre 2011 e 2014, muitos garantidos pelo Tesouro, por conta dos preparativos para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.

Desde dezembro de 2014, em 15 dos 26 Estados a despesa total do governo com pessoal cresceu mais do que as receitas e ameaça romper as barreiras regulatórias. Pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o limite prudencial é de 46,55% de despesa de pessoal em relação à Receita Corrente Líquida (RCL) e o teto é de 49%. Já ultrapassaram o limite prudencial 16 Estados, mais do que o dobro dos sete nessa situação em 2014, e dois estouraram o teto. Uma conta especialmente explosiva é a das previdências estaduais, que passou de 17,1% para 22% da RCL entre 2015 e 2017. Em casos mais graves, como o de Minas Gerais, chegou a 38,3% (Valor 15/10/18).

As receitas não acompanharam o ritmo. A participação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na carga tributária total caiu de 24% para 20% nos últimos 30 anos. A queda do ICMS é resultado principalmente da mudança do perfil da economia ao longo do tempo, com a diminuição da importância no Produto Interno Bruto (PIB) da indústria e da agricultura, principais bases de cálculo do ICMS, e aumento do peso dos serviços, que contribuem apenas indiretamente na arrecadação do imposto, por meio da tributação dos insumos (Valor 18/1).

Seis Estados – Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul – acumulam déficit de R$ 74,1 bilhões, com um ponto em comum: boa parte do “rombo” vem de dívidas pendentes de governos anteriores (Valor 21/1). Minas prevê déficit de R$ 11,5 bilhões neste ano, mas as pendências elevam o rombo para R$ 30 bilhões, incluindo repasses não feitos a municípios e o 13º salário de servidores, que ainda não têm previsão de pagamento.

No Rio, os R$ 17,5 bilhões que deixaram de ser pagos representam o dobro do déficit orçamentário previsto em R$ 8 bilhões para este ano, totalizando o rombo de R$ 25,5 bilhões.

Dos Estados com problemas fiscais mais agudos, apenas o Rio de Janeiro conseguiu aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). Criado no governo Temer e aprovado pelo Congresso em 2017, o RRF ameniza a pressão com a suspensão do pagamento da dívida estadual com a União por até seis anos, em troca de privatizações e da proibição de contratação e de reajuste de salários entre outras contrapartidas. Os demais Estados não preenchem as condições do programa que são ter dívida consolidada maior do que a receita corrente líquida (RCL); manter gastos correntes obrigatórios acima de 70% da receita; e ter obrigações contratadas que ultrapassem as disponibilidades de caixa de recursos não vinculados.

Diante disso, os governadores articulam uma mudança de regras para que seus Estados possam ser incluídos no programa de recuperação. Mas a equipe econômica não parece disposta a facilitar. Por enquanto, o único aceno feito foi a garantia de que a reforma da Previdência em articulação pelo Planalto vai valer também para os Estados. Isso não deixa de ser uma ajuda porque as despesas previdenciárias também contribuem para o aperto estadual, mas somente vai repercutir a médio e longo prazos, enquanto a crise dos Estados já é sentida a curtíssimo prazo. Vários governos não pagaram nem o 13º salário dos servidores. E, como preveem os especialistas, é só uma questão de tempo o aumento do número de Estados em dificuldades.