Por Valor Econômico

23/08/2019 – 05:00

O governo anunciou a inclusão de nove empresas estatais candidatas a serem privatizadas no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), em um total que agora chega a 17. Entraram na lista além de Correios, Telebras e Eletrobras, portos, creches inacabadas, presídios e parques nacionais, como os do Lençóis Maranhenses e Jericoacara. O anúncio ganhou mais destaque pela intenção declarada de privatizar uma estatal que não está na lista e não se sabe se um dia estará: a Petrobras.

De maneira geral, a privatização melhora a produtividade da economia, tende a ampliar a concorrência em alguns setores, deixa de pressionar o caixa do Tesouro, que sustenta várias delas, e permite ao Estado se concentrar naquilo que é sua função, como promover melhor educação, saúde e segurança. O Estado brasileiro tem 135 estatais, que detêm um patrimônio líquido de R$ 655 bilhões. Mas em 2017, 22 delas possuíam patrimônio negativo.

O governo de Bolsonaro gosta de jogar no ar números espetaculares e irreais, como já o fez com R$ 1 trilhão almejado para a venda de estatais e imóveis da União. Ontem, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse que a inclusão de novas estatais no PPI e outros projetos aumentariam a carteira do programa em R$ 800 bilhões – para R$ 2 trilhões.

É mais fácil propagandear as privatizações do que executá-las, ou inclui-las em programas oficiais do que sair deles. Em patrimônio, apenas cinco gigantes – Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil, Caixa e BNDES – somam R$ 602,5 bilhões dos R$ 655 bilhões de todo o universo estatal. Com exceção da Eletrobras, e da futura venda de ações que mantenham o Tesouro como acionista majoritário do Banco do Brasil – receita estimada de R$ 1 bilhão -, as empresas relevantes estão fora dos propósitos de curto prazo do governo. Os números sugerem que boa parte das demais estatais pode não ter valor de venda e precisem ser liquidadas ou absorvidas.

“O importante não é o timing, é a atitude”, disse Salim Mattar, secretário de Desestatizações, Desinvestimentos e Mercados. A atitude é positiva, confronta a herança de 12 anos de governos petistas, quando prevaleceu o viés estatizante, e resgata o elo modernizador com as privatizações dos anos 90. Mas, além de atitude, é preciso competência técnica e política. É importante convencer a opinião pública e o Congresso – que terá de autorizar a venda dos Correios e da Petrobras, por exemplo. Será preciso ainda convencer o presidente, novato nas hostes do liberalismo.

A inclusão no PPI não é segurança de privatização. “Quando entra no programa não temos certeza de que aquilo seja viável”, diz o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas. Até estatais que pareciam prontas para passar para mãos privadas não o fizeram. É o caso da Eletrobras, cuja venda vem sendo preparada desde o governo Temer e que se ocorrer, será em 2020. Privatizar os Correios, que tem 103,6 mil funcionários, exigirá aprovação do Congresso, processo incerto e demorado que entrará 2020 adentro. A Lotex foi posta à venda, mas não encontrou compradores ao preço oferecido, de R$ 1,2 bilhão.

O que acontece com os investimentos em infraestrutura pode servir de exemplo de realismo para o otimismo oficial.

Parcerias e marcos regulatórios para estradas, ferrovias e saneamento estão sendo planejados há anos, mas os investimentos urgentes, tanto para pôr fim à deterioração dos ativos como para empurrar a letárgica economia para frente, simplesmente não avançam. E estão há muito mais tempo no PPI.

A Petrobras executa com rapidez seu programa de privatizações, ao passar este ano R$ 72 bilhões em ativos para as mãos da iniciativa privada, as transportadoras de gás, ou pulverizar o capital da BR Distribuidora. Com gestão técnica e sem politicagem, a empresa equaciona seu endividamento e voltou a ter bons lucros, em um trabalho iniciado na gestão anterior. A estatal abre espaço à concorrência em vários setores que monopolizava, para se concentrar em exploração e produção. Com pleno domínio da tecnologia e um mar de petróleo do pré-sal a ser explorado, as resistências à sua venda serão ainda maiores do que sempre foram. Desde Getúlio Vargas ninguém fez tentativa séria de vendê-la, lembra o especialista Adriano Pires. O ministro Paulo Guedes quer, mas é possível que o coração de Bolsonaro não balance com isso.

É importante que as privatizações ocupem um papel de destaque na agenda do governo. Ele será cobrado pela eficiência em fazê-lo e pelos resultados que obtiver. É um desafio que prescinde de bravatas.