Estadão
03/08/2020

Por Renée Pereira

Para Guilherme Naves, o sócio da Radar PPP, as parcerias público-privadas vão ser uma alternativa viável para os governos tirarem projetos importantes do papel

Para o sócio da Radar PPP, Guilherme Naves, apesar da situação fiscal de Estados e municípios, as parcerias público-privadas (PPP) vão ser uma alternativa viável para os governos tirarem projetos importantes do papel. Ele conta que, depois de um susto no começo da crise, os lançamentos de empreendimentos voltaram e devem crescer nas áreas de saúde, iluminação pública, saneamento e turismo.

Qual o reflexo da pandemia nos contratos de PPPs?

A Radar PPP criou uma ferramenta chamada “Termômetro do Radar de Projetos” para avaliar isso. No mês de março, quando ocorreu a primeira morte no País, atingimos níveis recorde de suspensões e adiamentos de projetos que estavam em andamento. Em compensação, depois dessa primeira reação mais instintiva, foi possível perceber, já a partir do mês de abril, o índice de suspensão ou paralisação de projetos em andamento retornando a um patamar similar ao pré-pandemia. Ao contrário do que muitos poderiam supor, o número de projetos novos sendo lançados aumentou durante a pandemia. Na série histórica da Radar PPP, desde 2014, este ano teve o maior número de projetos lançados em um primeiro semestre. Mais de 260 novas intenções oficiais de fazer projetos de PPPs e concessões registradas, entre janeiro e junho.

Qual o desafio nessa área uma vez que os contratos dependem do poder público, que têm problema fiscal?

Se antes da pandemia os governos subnacionais tinham de se preocupar com a qualidade do gasto público por causa da situação fiscal, agora isso precisa ser uma obsessão. Se as PPPs e concessões eram parte do “arsenal” de que um gestor público poderia se valer para cumprir com esse desafio, seguirá sendo, ainda mais, neste momento. Para além do aspecto da eficiência, as PPPs e concessões são ferramentas chave para “financiar” a infraestrutura. Isso é uma motivação legítima para se fazer parcerias com a iniciativa privada. Mas introduz compromissos fiscais – diretos e contingentes – que perpassam gerações e que, portanto, precisam ser muito adequadamente monitorados.

Muito se fala que infraestrutura pode dar o upgrade que o País precisa para voltar a crescer. Como fazer os investimentos decolarem?

Antes de qualquer coisa, os projetos precisam ser bons, e os bons projetos são feitos por pessoas capacitadas no assunto. Governos devem investir em capacitar os agentes públicos que lidam com parcerias com iniciativa privada especificamente nessa matéria. Em segundo lugar, os investidores mais sérios não se mobilizam, normalmente, em função de oportunidades pontuais. Logo, governos precisam gerar previsibilidade, estruturando e se comunicando proativamente sobre uma carteira de projetos a serem desenvolvidos durante um ciclo de cinco anos, por exemplo. Em terceiro lugar, governos precisam se preocupar com suas reputações, gerindo contratos de maneira responsável e insulada de interesses políticos circunstanciais de curto prazo. E, também, o setor público precisa ser criativo para pensar em formas de financiamento “fora da caixa”, como títulos verdes e debêntures em geral. E, por fim, o governo federal – que tem prestado um intenso apoio aos Estados e Municípios na parte de estruturação de projetos por meio dos bancos públicos, como Caixa e BNDES – precisa se apresentar com mais energia para o debate relacionado às garantias dos projetos subnacionais.

Alguma área tem se sobressaído, apesar da pandemia?

Acredito que setor de saúde vai levar a sério a alternativa das PPPs de modo mais organizado. Não apenas pela necessidade de buscar financiamento, mas o próprio trabalho que tem sido feito no combate ao coronavírus por alguns hospitais que são PPPs. O setor de iluminação pública se mostrou praticamente imune aos impactos da pandemia, do ponto de vista de lançamento de novos projetos e de concorrências. Tem várias licitações interessantes marcadas para as próximas semanas. O setor de saneamento, com a aprovação do novo marco legal, é certo que irá se expandir ainda mais. Já houve várias concorrências lançadas no período, com destaque para a que deverá se tornar a terceira PPP da CESAN, para o município de Cariacica, com investimento estimado que passa de R$1 bilhão. O Governo do Ceará lançou a concorrência daquela que pode ser a primeira PPP de dessalinização do Brasil, com uma usina na orla de Fortaleza, com investimento de meio bilhão. E, por fim, como a retomada do setor do turismo deverá acontecer priorizando espaços abertos, os projetos de concessão de parques naturais também seguem avançando. O fato é que o mercado de PPPs e concessões, como um todo, não parou com a pandemia.