Por Vandson Lima – Valor Econômico

24/05/2019 – 05:00

A equipe econômica do governo avalia propor aos Estados o repasse de uma fatia maior do bônus de assinatura do leilão do excedente da cessão onerosa, estimado em R$ 106,561 bilhões. Em troca, os Estados deverão desistir de uma série de ações judiciais movidas contra a União, em especial relativas a repasses por conta da Lei Kandir.

É o que diz ao Valor o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). “O governo quer aproveitar a cessão onerosa para resolver outras pendências em uma tacada só. Existe a disposição do governo de negociar uma maior transferência desses recursos da cessão onerosa, mas não se pode fazer isso e manter o passado judicializado. É isto que está sendo discutido”, conta.

O governo deve apresentar a proposta, relata, em 15 dias. A intenção é que, contemplando os Estados, o Poder Legislativo dê autorização até 30 de junho para que se viabilize o leilão da cessão onerosa do pré-sal em outubro. “O Ministério da Economia está em discussões com as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado para que a matéria possa tramitar rápido”.

Feito o acordo, diz Bezerra, é possível até que o percentual destinado aos Estados supere os 30% previstos anteriormente.

O Congresso também terá de dar aval a uma mudança na regra de tetos de gastos para que se possa realizar o repasse à Petrobras e aos entes federativos. “Precisa aprovar uma lei complementar para que os recursos a serem transferidos via Fundos de Participação de estados e municípios [FPE e FPM] possam ser repassados sem comprometer a política do teto do gasto público”.

Em seu gabinete no Senado, Bezerra avaliou o momento turbulento do governo. Ministro da Integração Nacional no governo da ex-presidente Dilma Rousseff e conhecido como hábil articulador, o emedebista diz que não é momento de esticar a corda, mas de o presidente Jair Bolsonaro e integrantes do Palácio do Planalto estreitarem os laços com a classe política.

“A saída é mais moderação, mais paciência. O governo vai ter que cada vez mais se esforçar para contar com a confiança das lideranças do Congresso para as pautas importantes. A democracia direta via rede social é uma utopia”, aponta. A aposta no acirramento, fiando-se na força popular do presidente – que será testada nos protestos marcados para domingo – é um erro, avalia Bezerra. “O governo precisa insistir no caminho da política. Precisamos perseverar nisso porque esse é o canal para o diálogo com o Congresso. É preciso compreender como funciona a democracia representativa”.

O senador acredita que ainda é possível, na votação do Senado na terça-feira, retornar o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ao guarda-chuva do Ministério da Justiça, comandado por Sergio Moro. Já a recriação dos ministérios das Cidades e Integração, diz, é passado. “A criação dos dois ministérios é uma página virada. Chegou a ser apoiada pelas lideranças partidárias e pelo governo. Mas com as críticas que surgiram, não seguiu adiante”, lamenta. O próprio Bezerra era cotado para comandar uma das pastas.

Já a proposta para limitar a atuação dos auditores da Receita Federal – apelidada pelo líder do PSL, Major Olímpio (SP), de “emenda Gilmar Mendes”, em referência ao ministro do Supremo Tribunal Federal, que foi alvo de investigação do órgão – voltará à discussão, possivelmente entrando na proposta sobre abuso de autoridade, adianta. “Existem questões relativas ao abuso de autoridade e a ideia é, além de tratar do abuso, incluir também os auditores”. Ele nega qualquer influência do ministro na questão. “Nenhuma. A proposta foi trazida pelo Eduardo Braga (MDB-AM). Foi apoiada por diversos seguimentos, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)”.

Sobre a medida provisória que liberou o capital estrangeiro para as companhias aéreas, Bezerra afirma que não há decisão do Palácio sobre vetar ou não a volta de franquia de bagagens. Mas que aconselhará Bolsonaro a manter a medida, sob risco de depois ser derrotado pelo Congresso. “Se for para sugerir algo ao presidente, diria que as votações pela volta da franquia de bagagem foram muito expressivas tanto na Câmara quanto no Senado. Caso o governo decida pelo veto, terá de trabalhar muito. Aqui no Congresso o sentimento está muito contra a cobrança de bagagem”.

Menos otimista que outros integrantes do governo, o líder no Senado mantém sua previsão de que a reforma da Previdência só será aprovada em definitivo nas duas Casas do Congresso Nacional em meados de setembro. “Rodrigo Maia tem compromisso com a Previdência e um domínio forte sobre a Câmara. Continuo a acreditar que aprova lá até julho e no Senado até meados de setembro. Mas precisa trabalhar”, alerta.

O governo está comprometido em aprovar ainda neste semestre um novo marco regulatório do saneamento básico. Para Bezerra, são boas as chances de que isso ocorra através da Medida Provisória 868, apesar de a proposta perder a validade no dia 3 de junho, caso não seja aprovada pela Câmara e pelo Senado. “Houve um grande trabalho nos últimos dias.

Durante esse final de semana haverá mais rodadas de conversa com governadores”, diz.

“O espírito da MP é atrair o capital privado para universalizar o saneamento. O governo admite prorrogar os contratosprogramas dos Estados, desde que esteja garantida a presença do capital privado. A discussão avançou e queremos trazer uma boa notícia na segunda, com a votação da MP”, lembra, em referência ao instrumento pelo qual municípios contratam empresas estaduais para promover serviços de saneamento. Caso não seja possível aprovar a MP a tempo, o governo encaminhará um projeto de lei com “urgência urgentíssima”, para aprovar até o fim de junho, relata o líder. “Seja na MP ou em projeto, teremos um novo marco regulatório do saneamento ainda no primeiro semestre”, garante.

Outra medida próxima de um desfecho, afirma Bezerra, é o projeto que altera o marco legal das telecomunicações. A relatora é a senadora Daniela Ribeiro (PP-PB). Ela está se aproximando das conclusões necessárias para levarmos o projeto a votação no Senado ainda em junho”. O governo, diz, é a favor de manter o texto que veio da Câmara sem alterações, o que possibilitaria seu envio à sanção presidencial. Qualquer alteração remete a proposta novamente à Câmara. “Sou a favor de aprovar como está, sem mudanças. O setor de teles representa quase 10% do PIB brasileiro e pode ensejar investimentos da ordem de R$ 170 bilhões”.