Por Edna Simão – Valor Econômico

20/08/2019 – 05:00

Com a queda da taxa de juros, a equipe econômica quer reformular não só a política de investimentos do FGTS como também o montante de recursos destinados como subsídios à compra da casa própria para famílias de baixa renda do Minha Casa, Minha Vida (MCMV) e as taxas cobradas pela Caixa Econômica Federal para garantir sua sustentabilidade ao longo de dez anos.

Em entrevista ao Valor, o diretor do departamento do FGTS no Ministério da Economia, Igor Villas Boas, que também é presidente do conselho curador do fundo, garantiu que, mesmo com a permissão de saque, que vai retirar do fundo R$ 40 bilhões entre este e o próximo ano para estimular a economia, não haverá redução dos investimentos em habitação, saneamento básico e infraestrutura urbana. Ele ressaltou que fundo tem R$ 100 bilhões aplicados em títulos públicos e não será necessário antecipar a venda de papéis para fazer frente aos saques no fundo.

No longo prazo, no entanto, a situação é bem diferente. Segundo Villas Boas, a conta não fecha porque 60% dos ativos do fundo estão aplicados no setor de habitação, que, se incorporado o subsídios de algo em torno de R$ 9 bilhões ao ano, tem retorno zero, chegando, às vezes, a ser negativo para o FGTS. Por isso, os 40% restantes devem ter uma rentabilidade que compense essa perda e garanta a retorno dos saldos das contas dos trabalhadores de 3% mais TR, o que corresponde a praticamente R$ 15 bilhões por ano. “Esse é o desafio do fundo para os próximos dez anos”, frisou. “Precisamos de um equilíbrio, boa solução e boa aplicação dos recursos”, complementou.

Com a criação do Programa Minha Casa, Minha Vida em 2009, a destinação de subsídios para a cada própria subiu consideravelmente e agora está na casa dos R$ 9 bilhões. Foi instituída em um outro momento econômico em que as aplicações em títulos públicos feitas pelo FGTS mais que custeavam essa conta. Em janeiro de 2009, a taxa básica de juros era de 12,75% ao ano, valor que caiu gradualmente encerrando em 8,75% ao ano. Atualmente, a Selic está em 6% ao ano.

Por isso, os descontos concedidos precisam ser reavaliados.

Villas Boas afirmou que o que a ideia é estudar mecanismos para avaliar a efetividade desse desconto para a redução do déficit habitacional e estabelecer metas, por exemplo, de redução desse número ao longo dos anos. Para ele, mesmo com o aumento substancial da concessão de subsídios da casa própria, não houve redução consistente do déficit habitacional. “Não preciso reduzir o desconto. Mas preciso definir uma métrica”, contou.

O diretor do FGTS ainda chamou atenção para o fato que a remuneração cobrada do fundo pela Caixa foi estabelecida em 2008 e equivale a 1% do valor total de ativos. “A Caixa teve um ganho real na remuneração de 50% nos últimos dez anos”, contou. Em dez anos, os ativos do FGTS foram de R$ 170 bilhões para R$ 530 bilhões.

O estímulo à concorrência, por exemplo, poderia ajudar na redução dos custos e no melhor escoamento dos recursos no país. Villas Boas ressaltou que o governo é favorável a concorrência, mas ainda não há decisão sobre permitir que outros bancos façam a gestão dos recursos. Ele destacou, no entanto, que é preciso avaliar se esse custo não pode ser menor.

“Estamos estudando alternativas, mas está longe de estar definido.” Villas Boas deixou claro que o FGTS tem o papel social de garantir, como prevê a legislação, boas condições de vida ao trabalhador. Mas, para que isso aconteça, é preciso fazer com que as aplicações do fundo tenham retorno nas aplicações feitas pelo fundo -por exemplo, pelo braço financeiro, o FI-FGTS. Para o diretor, se vai assumir um risco maior, é preciso ter rentabilidade mais alta. Até porque é preciso remunerar as contas do fundo e, ao mesmo tempo, conceder descontos para a compra da casa própria e ainda ter recursos para investir em infraestrutura.

Além de estar estudando formas de reduzir receitas e garantir melhor rentabilidade dos investimentos, Villas Boas destacou que a equipe econômica está trabalhando para alavancar as receitas.

Ele citou a medida provisória da liberação do FGTS (MP 889), que traz uma mudança que estabelece que as empresas ao realizarem os procedimentos para o recolhimento dessa obrigação façam a chamada “homologação automática”. Nela, há uma confissão de que o recolhimento é devido, mesmo que a empresa não efetue o pagamento total. A nova sistemática, como antecipado recentemente pelo Valor, deve permitir não só melhor fiscalização pela Secretaria de Trabalho, mas também mais celeridade para o trabalhador verificar se os recursos estão sendo depositados e eventualmente acionar a Justiça. Além disso, será desenvolvido um aplicativo em que o trabalhador possa acompanhar os depósitos feitos pelas empresas no fundo e, se for o caso, denunciar quando não forem realizados.