Valor Econômico
27/03/2020

Por Martha Funke

Desoneração do setor pode estimular a economia digital

Questões tributárias e fiscais ainda desafiam a capacidade de investimentos das operadoras no Brasil. Mesmo em meio a discussões sobre reformas em andamento no Congresso, é pequeno o avanço em temas como contribuições setoriais.

Entre elas, o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), criado para cobrir obrigações de universalização do serviço público de telefonia fixa – basicamente, orelhões. A alíquota de 1% sobre a receita operacional bruta da prestação do serviço já arrecadou cerca de R$ 30 bilhões, pelos cálculos de Luiz Augusto Bichara, sócio do Bichara Advogados, que assessora players do setor.

A maior parte dos recursos é destinada a pagamento da dívida pública e benefícios previdenciários, entre outros. Para a finalidade legal do fundo, foram apenas 0,02%, de 2001 a 2016. Outro exemplo são as taxas de Fiscalização e Instalação (TFI) e Funcionamento (TFF), voltadas ao custeio das atividades da Anatel por meio do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel). Entre 1997 e 2015, foram mais de R$ 34,8 bilhões, contra R$ 4,7 bilhões consumidos pela agência – o Tesouro ficou com 81%, dos quais 52% em gastos não identificados.

“A carga tributária média de 45% inibe investimentos”, avalia Marcos Ferrari, presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTelebrasil). Mesmo assim, perto de R$ 30 bilhões aplicados a cada ano colocam o setor de telecomunicações na liderança dos investimentos em infraestrutura no país, seguidos por rodovias (R$ 19 bilhões) e saneamento (R$ 12 bilhões), segundo dados do BNDES de 2018.

Nas contas do SindiTelebrasil, em 20 anos a arrecadação de tributos sobre o setor alcançou R$ 102 bilhões, com R$ 8 bilhões aplicados em telecomunicações. A entidade defende a reforma tributária para amenizar o que identifica como desequilíbrios: a disparidade na cobrança de ICMS, em média 20,38% para o setor e 6,72% para as demais atividades do país, e ISS, respectivamente 1,39% e 0,86%.

O imposto único sobre bens e serviços (IBS) é a proposta que mais atende essa indústria, diz Ferrari. As duas Propostas de Emenda Constitucional (PECs) em discussão na recém-instaurada Comissão Mista da Reforma Tributária adotam esse caminho. A PEC 45/2019, da Câmara dos Deputados, propõe substituir três impostos federais (IPI, PIS e Cofins), ICMS e ISS, por IBS. A PEC 110/2019, do Senado, entre outras sugestões, prevê extinção de nove tributos (IPI, PIS, Cofins, ICMS, ISS, IOF, Pasep, salário-educação e Cide-Combustíveis) por IBS estadual e imposto federal seletivo sobre itens como derivados de petróleo, combustíveis e lubrificantes, cigarros, energia elétrica e serviços de telecomunicações.

A comissão deve unificar as duas, mas aguarda proposta do Executivo que deve chegar “fatiada” em medidas mais simples para acelerar a aprovação. A primeira seria unificar PIS e Cofins em Imposto de Valor Agregado (IVA) com alíquota única de 11%.

A defesa do fim dos fundos e das taxas vinculadas a eles, segundo Ferrari, impacta ainda a internet das coisas (IoT), uma das principais aplicações do 5G. Isso porque a receita média para um dispositivo IoT seria de R$ 12, mas seu custo tributário passa de R$ 14, considerados Fistel, Fust, Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel), entre outros.

O tema é alvo de Projeto de Lei (PL) 7565/17, do deputado Vitor Lippi (PSDB/SP), aprovado na Câmara, em tramitação na comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado como PL 6549/19 e que elimina TFF, TFI, Condecine e CFRP para dispositivos máquina a máquina.

Pelos cálculos da LCA Consultores, a medida pode gerar uma perda de arrecadação de R$ 1,8 bilhão em três anos. Mas os negócios apoiados pela desoneração podem render R$ 15,2 bilhões de arrecadação total no período.