Folha de São Paulo
06/02/2020

Por Ricardo Della  Coletta, Gustavo Uribe e Talita Fernandes

Segundo aliados do presidente, o movimento deve dar início a uma reforma ministerial

O presidente Jair Bolsonaro trocou o comando do Ministério do Desenvolvimento Regional —pasta responsável pelo Minha Casa MinhaVida— nesta quinta-feira (6). O secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Rogério Marinho, substitui Gustavo Canuto.

Com a medida, Bolsonaro dá início a uma reforma ministerial planejada desde o ano passado. A ideia é que as demais mudanças sejam feitas a conta-gotas e ocorram a partir da próxima semana.

A mudança, segundo assessores presidenciais, teve o apoio do ministro da Economia, Paulo Guedes, e das bancadas parlamentares do Norte e do Nordeste. Bolsonaro manifestava incômodo com a atuação de Canuto.

O presidente recebia críticas de deputados e senadores pela falta de diálogo do ministro com o Poder Legislativo e por não entregar resultados em iniciativas como o Minhas Casa Minha Vida.

O agora ex-ministro desconfiava havia duas semanas que seria exonerado e foi avisado pelo Palácio do Planalto nesta quarta-feira (5) que seria retirado do cargo.

Para não desprestigiar Canuto, Bolsonaro pediu que ele fosse realocado em outra estrutura. Nesta quinta, Canuto teve um encontro com Bolsonaro pela manhã, no qual o presidente lhe informou que seguiria no governo, mas em nova função.

No início da tarde, ficou definido que ele assumiria a presidência doDataprev, uma empresa pública vinculada ao Ministério da Economia. A decisão foi tomada em reunião entre Bolsonaro, Guedes e Marinho.

Para o comando do Desenvolvimento Regional, Bolsonaro estabeleceu desde o início que queria uma solução interna, que evitasse entregar o cargo a uma disputa partidária.

O presidente foi convencido pelo nome de Marinho tanto pela habilidade política do ex-deputado federal quanto pela perspectiva de melhorar o diálogo com a bancada nordestina. Ele é do Rio Grande do Norte.

A mudança de Canuto é a quinta demissão de um ministro desde que Bolsonaro assumiu o Palácio do Planalto.

O controle do Desenvolvimento Regional é visto como um cargo eminentemente político. A pasta é responsável pela liberação de verba para estados e municípios —um afago a congressistas que querem destinar recursos a suas bases eleitorais.

Além de Canuto, a saída de Onyx Lorenzoni da Casa Civilé dada como certa no Palácio do Planalto. O presidente ainda procura um substituto para o cargo diante da negativa de Jorge Oliveira, da Secretaria-Geral, em assumir o posto.

Pelo desenho que vem sendo feito por Bolsonaro, Onyx deve assumir a Cidadania, hoje ocupada por Osmar Terra, seu aliado. O futuro de Terra ainda é incerto, mas a maior probabilidade é que ele reassuma o seu mandato na Câmara dos Deputados.

A expectativa é de que a alteração ocorra na próxima semana.

Aliado de Guedes, que ganha força com a mudança na Esplanada, Marinho esteve à frente das negociações com o Congresso para aprovar a reforma da Previdência no ano passado.

Em uma rede social, Marinho agradeceu a confiança do presidente ao convocá-lo para “honrosa missão de conduzir as políticas públicas ligadas à integração e ao desenvolvimento regional e urbano”. Ele se tornou uma liderança na articulação política do governo.

Além disso, o programa habitacional Minha Casa Minha Vida é outro fator do desgaste de Canuto. O número de casas entregues para a população mais pobre recuou em 2019 e a proposta de reformulação da ação está travada.

“[Marinho] foi escolhido pela sua competência e pelo o que tem para oferecer para continuar o trabalho do Gustavo Canuto”, disse Bolsonaro em transmissão ao vivo em uma rede social.

 A troca foi oficializada em edição extra do Diário Oficial da União, publicada no fim da tarde desta quinta. Marinho será substituído na Secretaria Especial de Previdência e Trabalho pelo atual adjunto, Bruno Bianco, que também trabalhou na articulação pela reforma da Previdência.

Bianco atuou no desenho da proposta de reformulação das regras de aposentadoria e pensões como assessor especial da Casa Civil no governo de Michel Temer (MDB).

O Dataprev, que será assumido por Canuto, também causa desgaste no governo. A empresa pública cuida do sistema da Previdência Social, que ainda não está totalmente adaptado às novas regras de aposentadoria e pensão, em vigor desde novembro do ano passado.

A intenção da equipe econômica é privatizar o Dataprev.

As mudanças na estatal são essenciais para que Bolsonaro consiga zerar a fila de espera do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Diante do desgaste causado pela demora na análise de pedidos de aposentadorias e pensões, o governo trocou, na semana passada, o comando do órgão.

Mais de 1 milhão de requerimentos aguardam resposta há mais de 45 dias, descumprindo o prazo legal.

Desde maio, o presidente cogitava retirar Canuto da pasta. Ele estava perto de perder o cargo quando o Legislativo negociou com a Casa Civil mudanças na estrutura do governo, para que fossem recriadas as pastas das Cidades e da Integração Nacional.

Na época, a intenção era entregar o comando das duas estruturas para partidos políticos. O presidente cogitava para as estruturas partidos como Republicanos e PP, na tentativa de consolidar a base do governo no Congresso.

Com a disputa dos partidos pelo cargo, no entanto, Bolsonaro recuou.

O ex-ministro também enfrentou desgaste com Guedes por causa da reformulação programa habitacional. Ainda não há consenso sobre o formato, apesar de as discussões estarem ocorrendo desde o início do governo Bolsonaro.

Inicialmente, a intenção era apresentar a reformulação em julho do ano passado. Diante do impasse, o prazo passou para dezembro. Até hoje, a versão final ainda gera discussões.

Há divergências entre os ministérios do Desenvolvimento Regional e da Economia sobre como manter o Minha Casa Minha Vida em pé sem exigir grandes aportes do Orçamento da União.

A mudança no programa habitacional é uma das apostas do Palácio do Planalto para que o governo crie uma marca social.

O primeiro ano da gestão Bolsonaro foi marcado pela aprovação de medidas impopulares no Congresso, como a reforma da Previdência, e o recuo na cobertura de programas sociais, o que inclui o Bolsa Família.