Valor Econômico
06/02/2020

Por Estevão Taiar e Alex Ribeiro

Copom diz que dá peso crescente à meta de inflação de 2021 e destaca riscos do cenário

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central cortou ontem os juros básicos da economia de 4,5% para 4,25% ao ano, mas deu indicações de que poderá manter a taxa nesse novo patamar em sua próxima reunião, em março.

“Considerando os efeitos defasados do ciclo de afrouxamento iniciado em julho de 2019, o Comitê vê como adequada a interrupção do processo de flexibilização monetária”, disse em comunicado divulgado logo após a reunião de ontem.

O colegiado repetiu uma linguagem mais cuidadosa que havia adotado no encontro anterior. “O atual estágio do ciclo econômico recomenda cautela na condução da política monetária”, afirmou no comunicado.

Apesar da sua indicação de “interrupção” no ciclo de distensão monetária, o colegiado voltou a ponderar que as suas próximas decisões “continuarão dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação”.

O atual ciclo de cortes teve início em julho de 2019, quando a Selic estava em 6,5% ao ano. Em cada uma das quatro reuniões que se seguiram, o colegiado do Banco Central (BC) diminuiu a Selic em 0,5 ponto percentual, até optar, de maneira unânime, pelo corte de 0,25 ponto divulgado ontem. Ao longo desse período, o mercado financeiro reavaliou várias vezes a extensão do ciclo de distensão monetária, que no início poucos acreditavam que poderia levar a Selic a percentuais abaixo de 5% ao ano.

As projeções condicionais também indicam a inflação convergindo para a meta de 3,75% estabelecida para o ano que vem. No comunicado, o colegiado destacou que 2021 tem “peso crescente” em suas decisões sobre taxa de juros.

Em um cenário híbrido, as projeções do BC para a inflação estão de 3,5% para este ano e 3,7% para o ano que vem. A meta oficial para 2020 é de 4%. Esse cenário foi construído com a hipótese de trabalho de um câmbio constante em R$ 4,25 e trajetória de juro extraída da pesquisa Focus. O consenso dos economistas do setor privado é que a taxa Selic encerraria 2020 em 4,25% e 2021, em 6%.

Em outro cenário, com câmbio também em R$ 4,25 e taxa de juros constante em 4,5%, as estimativas para a inflação ficam de 3,5% para este ano e em 3,8% para o ano que vem.

O cenário básico de inflação do comitê segue com riscos em ambas as direções – ou seja, há fatores que podem fazer a inflação ficar tanto acima quanto abaixo do projetado pelo Copom. Mas o colegiado mudou a linguagem que havia usado para tratar de um perigo em particular: “O risco [altista] se intensifica no caso de aumento da potência da política monetária decorrente das transformações na intermediação financeira e no mercado de crédito e capitais”, disse.

O BC também alterou a sua avaliação a respeito dos núcleos de inflação. Por excluírem do cálculo itens e serviços com preços mais voláteis, os núcleos na teoria respondem mais à atividade econômica e à política monetária. Até a reunião de ontem, o Copom afirmava que “as diversas medidas de inflação subjacente” estavam em “níveis confortáveis”. Agora, elas “encontram-se em níveis compatíveis com o cumprimento da meta para a inflação no horizonte relevante”.

O colegiado manteve a sua avaliação de que a economia segue trajetória de recuperação, apesar da safra de indicadores ambíguos divulgados recentemente, como a queda de 0,7% da produção industrial em dezembro, que alimentou apostas no mercado de mais estímulos. “Dados de atividade econômica divulgados desde o último Copom indicam a continuidade do processo de recuperação gradual da economia brasileira”, diz o comunicado.

Já o setor externo, embora siga “relativamente” benigno, ficou mais incerto, na avaliação do Copom. “Apesar do recente aumento de incerteza, o caráter acomodatício da política monetária nas principais economias ainda tem sido capaz de produzir ambiente relativamente favorável para economias emergentes”, disse. Não foi feita nenhuma menção ao risco do coronavírus.

A decisão de ontem veio em linha com o esperado pela maior parte do mercado. Na semana passada, entre 76 instituições consultadas em levantamento feito pelo Valor Data, 54 previam corte de 0,25 ponto percentual da Selic, para 4,25% ao ano. Outras 22 casas esperavam estabilidade. O Copom volta a se reunir nos dias 17 e 18 de março.