Valor Econômico
24/05/2021

Por Daniel Rittner

Desde janeiro, prefeituras avançaram em 132 projetos de concessão ou parcerias, aponta consultoria especializada

Com um orçamento cada vez mais limitado, as gestões municipais iniciadas neste ano reforçaram suas apostas nas parcerias público-privadas para melhorar a oferta de serviços à população.

De janeiro até a semana passada, os prefeitos novos ou reeleitos avançaram em 132 projetos de concessão ou parcerias, segundo levantamento feito pela consultoria Radar PPP a pedido do Valor. O avanço engloba consultas públicas abertas, editais publicados, licitações realizadas e contratos firmados no período.

Projetos de eficiência energética, iluminação pública, água e esgoto, resíduos sólidos e mobilidade urbana são os mais comuns da lista. “Com as dificuldades orçamentárias atuais e a demanda por melhores serviços, pode-se dizer que a intensificação das parcerias é um caminho sem volta”, afirma o sócio da Radar PPP, Bruno Pereira.

O prefeito do Recife, João Campos (PSB), lançou neste mês um programa com o objetivo de captar R$ 1 bilhão em parcerias estratégicas com a iniciativa privada – entre investimentos e pagamento de outorgas – até 2024.

“As concessões e PPPs são saídas naturais para as prefeituras do país”, diz o secretárioexecutivo de Parcerias Estratégicas do Recife, Thiago Ribeiro, responsável pelo novo programa. Para ele, caminha-se para ter um poder público menos “executor” e mais “regulador”. O principal desafio no Recife, acrescenta, é a falta de experiência – nenhum contrato foi assinado até hoje – e a escassez de recursos humanos para elaborar projetos, preparar editais, conversar com o mercado.

Na mira da gestão João Campos estão concessões ou PPPs nas áreas de mobiliário urbano (abrigos de ônibus e relógios digitais), parques, usinas fotovoltaicas para abastecer escolas e unidades básicas de saúde, recuperação de prédios públicos deteriorados para habitação popular e até uma parceria para a gestão do edifício-sede da própria prefeitura.

A meta de Ribeiro é que os primeiros contratos sejam assinados em 2022. “É uma carteira ousada e abrange todas as áreas em que se pode pensar em parcerias municipais. O único pré-requisito é melhorar os serviços à população.”

O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), já encontrou um programa já plenamente estruturado – e decidiu tocar as desestatizações adiante. “O cidadão da rua, aquele que precisa de nós, não quer saber se o serviço é público ou é privado. Ele quer serviço de qualidade”, avalia a secretária municipal de parcerias, Ana Pellini.

A capital gaúcha se prepara para oferecer três grandes projetos à iniciativa privada. Um deles, com estudos já concluídos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), é a concessão dos serviços de água e esgoto. O prefeito terá que fazer uma opção entre as alternativas apresentadas pelo banco – por exemplo, se concede todo o saneamento ou se mantém com o município o tratamento de água.

Outro é uma PPP de drenagem urbana. A Caixa, com o apoio do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal, está fazendo os estudos. O terceiro grande projeto será objeto de uma chamada para estudos (procedimento de manifestação de interesse): a gestão de resíduos sólidos, o que poderia abranger todo o ciclo, da coleta de lixo até a operação de aterros sanitários.

Outros projetos, como PPPs de hospitais e um novo trecho da orla do Guaíba, estão no prelo. “Independentemente do viés político de cada prefeito, é um caminho irreversível e que ganhará corpo”, diz Pellini. Ela garante que, no caso de Porto Alegre, a interlocução com o mercado está bastante madura e não faltam investidores. De modo geral, porém, a secretária questiona se haverá interessados em assumir todos os projetos municipais oferecidos. “É a pergunta que me faço sempre. Em muitos lugares ainda há certa insegurança jurídica e falta de experiência regulatória.”

Para mitigar esses problemas, a Radar PPP estreou um programa de qualificação dos gestores municipais no desenvolvimento de concessões e PPPs. Por meio de um treinamento online, é compartilhada a experiência de projetos bem-sucedidos e dá-se um roteiro de como estruturar parcerias.

O treinamento pode garantir um “selo de compromisso municipal com concessões e PPPs” da consultoria ao fim do processo – o que sinaliza para o mercado o nível de engajamento das prefeituras. Já passaram ou estão passando por essa capacitação 29 cidades.

Uma delas é Palhoça (SC), com cerca de 175 mil habitantes, que já tem uma PPP de iluminação pública em execução e acaba de fazer a concessão do mercado municipal. Outros projetos – o transporte coletivo urbano, o serviço funerário, a exploração das placas de sinalização – estão em andamento. O prefeito é do PSD.

A secretária de administração, Cristina Schwinden Schmidt, diz que uma das maiores prioridades agora é viabilizar a concessão dos serviços de água e esgoto em Palhoça. Hoje o tratamento dos rejeitos cobre só 8% do total e seria preciso investir R$ 2 bilhões para cumprir as metas de universalização do marco legal do saneamento. O edital deve sair no segundo semestre.

Para a secretária, o mercado está aquecido e não devem faltar interessados. “Se a gente demonstra celeridade e transparência, elabora um edital robusto e sem nenhum tipo de direcionamento, isso atrai investidor.”