Valor Econômico
14/12/2020

Por Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro e Vandson Lima

Líderes partidários dizem que vetos ao marco legal do saneamento básico e ao pacote anticrime só devem ser analisados no próximo ano

Os vetos ao marco legal do saneamento básico e ao pacote anticrime só devem ser analisados em 2021, segundo líderes partidários. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), convocou a sessão do Congresso amanhã apenas com o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021 e outros dois de créditos orçamentários. Os vetos ficaram de fora usando uma brecha criada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por causa da pandemia e não há prazo para que sejam analisados.

A Constituição determina, desde 2013, que os vetos presidenciais passam a trancar a pauta do Congresso se não forem analisados após 30 dias, o que impede que os projetos orçamentários sejam votados. A mudança ocorreu após milhares de vetos ficarem acumulados por décadas no Legislativo sem deliberação. Com a pandemia e o sistema remoto, porém, essa regra já foi afrouxada e os parlamentares aprovaram projetos que autorizavam gastos do governo sem votar antes os vetos.

O líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), disse que os vetos ficam para 2021. “Foi decisão do governo”, afirmou. O líder do Novo, deputado Paulo Ganime (RJ), foi na mesma linha e comentou que a análise deve ocorrer só sob a gestão do novo presidente do Senado, que comanda também as sessões do Congresso. “Não é o certo, mas abrimos precedentes para os PLNs”, disse.

O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), negou que o adiamento seja um pedido do Executivo. “Não tem vetos na pauta porque não houve reunião para tratar disso. É uma sessão para votar LDO “, afirmou. O deputado Celso Russomanno (RepublicanosSP), vice-líder do governo, argumentou que os vetos não estão na pauta por “questões técnicas”. “Com o sistema de votações remotas, demoraria muito tempo para votar todos. Corríamos risco de não aprovar a LDO até o fim do ano”, disse. São 22 projetos de lei vetados parcial ou integralmente que trancam a pauta.

Os vetos mais antigos são do ano passado e se referem a 24 artigos e dispositivos do pacote anticrime proposto pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro para endurecer o combate a corrupção e criminalidade. Como o Valor mostrou, há um acordo entre o governo, PUBLICIDADE oposição e Centrão para derrubar a maioria dos vetos e fazer com que tenham força de lei, mas os partidos tinham preferido deixar a polêmica votação para depois da eleição municipal.

Já os vetos ao novo marco legal do saneamento básico estão pendentes desde julho, há mais de seis meses. O principal dispositivo vetado pelo presidente Jair Bolsonaro é o que permitia renovar por 30 anos os contratos com as empresas estatais. Com o veto, deve ocorrer agora licitação entre as companhias estatais e privadas. Governadores e senadores acusam o governo de ter quebrado um acordo para sanção desse trecho e pressionam o Congresso a derrubar o veto, para que volte a valer o prazo de transição.

Vice-líder do governo na Câmara e ex-presidente da comissão que votou o marco do saneamento básico, o deputado Evair de Mello (PP-ES) culpa Alcolumbre pelo veto não estar na pauta e provavelmente ficar para 2021. “O governo quer votar, está pronto e tem voto para manter o veto na Câmara”, disse. “Esse cara está brincando, não quer polêmica no final do mandato, mas com isso atrasa a implantação do marco e os investimentos”, criticou.

A oposição, contudo, pretende cobrar para que os vetos sejam votados antes da LDO. “Terão que nos atropelar para mudar isso”, disse o líder da minoria no Congresso, o deputado Carlos Zarattini (PT-SP). Essa também é a posição de alguns partidos independentes. O líder do Cidadania, deputado Arnaldo Jardim (SP), disse que a pauta sem os vetos é antiregimental e que até pode aceitar votar a LDO, mas não os dois projetos de créditos orçamentários que liberaram R$ 140 milhões para os ministérios.

Os partidos de oposição, porém, ficarão numa “sinuca de bico” se tentarem obstruir a sessão e impedirem a aprovação da LDO, segundo um parlamentar influente. Isso porque o governo não teria regras para gastos em 2021 e precisaria pagar suas despesas, como salários e aposentadorias, por medidas provisórias com créditos extraordinários.

Esse tipo de crédito não é limitado pelo Teto de Gastos (que proíbe o crescimento das despesas acima da inflação). Com isso, só em janeiro e fevereiro se abriria uma “folga” de cerca de R$ 300 bilhões dentro do teto, o que permitiria destravar investimentos e até criar um auxílio emergencial dentro do próprio Orçamento, sem precisar cortar outros gastos. Tudo isso seria pago com o aumento do endividamento público, mas permitiria ao governo gastar mais (e se fortalecer) sem mexer no Teto.