Por Rhayana Araújo, gerente de Comunicação da Aesbe
Uma das defesas da Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe), para melhorias do setor, é a atenção em relação ao atendimento da população que vive em áreas rurais e periféricas do país e que não serão atendidas apenas com a estratégia concebida pelo novo marco do saneamento da forma que está.
A Aesbe constantemente alerta para o que vem ocorrendo nas modelagens para a privatização dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil, que simplesmente excluem as áreas rurais sob a justificativa de que tornam os contratos inviáveis. “Ao invés de construir modelos que tornem viáveis os serviços a toda a população, a atual legislação favorece as empresas privadas, oferecendo a elas as cidades rentáveis e deixando a população rural sem os serviços essenciais à vida”, afirma Neuri Freitas, presidente da Aesbe e da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece).
Em 2020, a gestão federal anterior aprovou no Congresso Nacional a Lei 14.026 que reforma o marco legal do saneamento básico, e, dentre outras mudanças, revisa de forma significativa a lei 11.445/2007. O mesmo governo publicou três Decretos para regulamentar, em parte, a nova lei – Decretos nº 10.588/2020, 10.710/2021 e 11.030/2022. As mudanças na Lei e os Decretos deixaram mais lacunas do que soluções para a provisão de atendimento à população das periferias e áreas rurais, ao privilegiar a privatização do saneamento básico como a única solução para os investimentos necessários para o atendimento às periferias e às áreas de assentamentos precários das cidades.
“Para levar saneamento à população de baixa renda nas periferias, favelas, ocupações informais e nas áreas rurais é absolutamente necessário que o estado brasileiro estabeleça políticas públicas integradas, articuladas com investimentos de recursos financeiros de diversas fontes e ampla capacidade de fiscalização”, afirma o presidente da Aesbe, Neuri Freitas.
Saneamento para as áreas periféricas
Recentemente, o Ministério das Cidades criou a Secretaria Nacional de Políticas para Territórios Periféricos, também conhecida como Secretaria de Periferias, com o objetivo de promover – em parceria com governos locais, organizações sociais e população local – políticas públicas voltadas para as regiões periféricas das cidades brasileiras, que muitas vezes são esquecidas e enfrentam desafios específicos em termos de infraestrutura, saneamento básico, acesso a serviços e oportunidades de trabalho e renda. Guilherme Simões Pereira, ativista do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), foi nomeado para comandar a pasta.
A Aesbe acredita que a criação da Secretaria de Periferias é um ganho e espera que, em conjunto com a Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, o trabalho para a universalização do acesso ao saneamento básico nessas áreas, incluindo a disponibilidade de água potável, coleta e tratamento de esgoto e gestão de resíduos sólidos, seja uma prioridade.
Saneamento Rural
O marco legal do saneamento básico deixa claro, desde 2007, quando a Lei 11.445 foi sancionada pelo Presidente Lula, que a universalização dos serviços públicos de saneamento básico deve incluir, não somente as populações das áreas urbanas, mas também as das áreas rurais. Nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS, da Organização das Nações Unidas – ONU, a meta 6 fixa que os países signatários, dos quais o Brasil faz parte, devem universalizar para todos o acesso aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário até 2030. O pleonasmo “universalizar para todos” serve para reforçar que toda a população deve ser atendida pelos serviços, independente de viverem em áreas urbanas ou rurais.
Segundo o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), documento oficial de planejamento do Governo Federal, no ano de 2019 – último ano em que tais dados foram publicados –, o percentual de domicílios abastecidos com água por rede de distribuição ou por poço ou nascente nas áreas rurais é de 71,3%, enquanto nas áreas urbanas é de 97,8%. Considerando urbano + rural o índice é de 94,6%. Em relação ao esgotamento sanitário, o percentual de domicílios servidos por rede coletora ou fossa séptica para os excretas ou esgotos sanitários nas áreas rurais é 30,7%, enquanto nas áreas urbanas é de 81,2%. Para as áreas urbanas + rurais o índice é de 75,9%.
O Plansab propõe que a universalização dos serviços de água e esgotos deve adotar não somente o atendimento por redes, mas também as soluções individuais ou alternativas, tão importantes nas áreas rurais. Por este motivo, os índices definidos pelo Plansab são mais elevados do que aqueles amplamente divulgadas pela grande mídia, que normalmente utiliza os índices do SNIS, os quais se referem somente ao atendimento por redes de distribuição de água e de coleta de esgotos. Em 2019, considerando as áreas urbanas + rurais, tais índices foram de 83,7% para água e 61,9% para esgotos. Estes índices não levam em conta a dicotomia da falta de atendimento por serviços de água e esgotos na área urbana e na área rural. Esta realidade, tem o objetivo de dar conotação alarmista aos dados e favorecer a privatização dos serviços públicos no país. Divulgam índices menores e desconsideram o próprio planejamento nacional do Governo Federal, consubstanciado no Plansab.
“O Brasil do Futuro não pode ser excludente. O saneamento rural é um direito que deve ser respeitado e transformado em realidade concreta. Por isso, é urgente que sejam feitas as reformulações dos decretos do novo marco. A Aesbe afirma que sem as devidas alterações, a universalização dos serviços de saneamento não será uma realidade”, finaliza o presidente Neuri Freitas.