Valor Econômico
13/05/2020

Por Marta Watanabe e Gabriel Vasconcelos

Em março, indicador caiu 6,9%; analistas veem tombo de dois dígitos no mês passado

De fevereiro para março o setor de serviços caiu 6,9%, a maior queda da série histórica da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS), divulgada desde janeiro de 2011. Para o IBGE, responsável pela pequisa, e para analistas, o recuo precede tombos ainda maiores nas próximas divulgações. A retração deverá vir de forma generalizada e, para alguns economistas, poderá chegar a dois dígitos em abril.

Em março, diz o IBGE, os efeitos da pandemia se refletiram apenas nos últimos dez dias do mês, quando se disseminaram as medidas de isolamento social contra o avanço da covid-19.

“Com o mês de abril inteiro paralisado, teremos mais empresas afetadas e, quem sabe, um número ainda em maio e até quando [a crise] durar. Então os efeitos tendem a ser mais intensos do que a gente observa hoje”, disse ontem o gerente da PMS, Rodrigo Lobo. “É claro que, em algum momento, o dado vai parar de cair tanto e a gente não vai mais sentir a variação [porque os dados são relativos a desempenhos anteriores], mas, em abril e maio, vamos identificar mais fragilidade e perda de receita no setor de serviços.”

Para a economista Luana Miranda, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), a estimativa é de que o volume do setor de serviços tenha recuo de dois dígitos em abril, na margem. Ela destaca que, para o varejo ampliado de abril contra março, o Ibre projeta queda de quase 25% na série com ajuste sazonal. Luana explica que o varejo tem algumas correlações com certos segmentos de serviços.

Vitor Vidal Velho, economista da LCA Consultores, prefere olhar as variações dos indicadores da PMS em relação ao mesmo período do ano anterior. Para ele, a percepção, por enquanto, é de que as quedas se intensifiquem em todos os grupos de serviços da pesquisa em abril. A projeção da LCA é de que o recuo sobre igual mês de 2019 do setor de serviços se aprofunde de 2,7% em março para 12% em abril. Nesse caso, o tombo seria de 12,7% no acumulado de março a abril deste ano contra igual período do ano passado. Para abril, na margem, a LCA projeta queda de 6,2%, porque leva em consideração uma base de comparação menor.

Helcio Takeda, da Pezco Economics, diz que a projeção preliminar da consultoria é de queda entre 25% a 30% no total do setor de serviços, de março para abril, com ajuste sazonal.

Nos grupos que compõem a PMS, o IBGE destacou a queda nos serviços prestados às famílias, que despencou 31,2% em março, contra fevereiro, na série com ajuste sazonal. Sem precedentes, a magnitude desse recuo surpreendeu negativamente, diz Vidal Velho, mesmo que o indicador geral da PMS tenha vindo em linha com o projetado pela LCA em março. Na comparação com o mesmo período de 2019, esse grupo caiu 33,4%. A queda estimada pela consultoria, diz ele, foi de 14%.

Outro grupo que puxou para baixo o setor de serviços em março foi o de “transportes, serviços auxiliares de transporte e correio”. O grupo recuou 9% sobre fevereiro, com ajuste sazonal.

Nesse critério, o tombo dos transportes só ficou atrás do registrado na greve dos caminhoneiros, em maio de 2018 (-9,5%). Na comparação contra igual mês do ano passado, o desempenho desse grupo ficou praticamente estável, com alta de 0,3%.

Nesse grupo, Vidal Velho chama a atenção para o transporte aéreo, com queda de volume de 11,7% na comparação com março de 2019, seguido pelo recuo de 5,8% no transporte terrestre. Esse último, diz ele, é muito correlacionado com a indústria, já que a malha rodoviária é o principal meio de escoamento de produção. “Isso quer dizer que se o dado de março veio ruim, o pior ainda está por vir em abril e maio.”

Ainda na comparação interanual, o IBGE destaca que o setor de “outros serviços” cresceu 13,7% e deu a principal contribuição positiva, impulsionado, principalmente, pela maior receita das empresas de corretoras de títulos, administração de bolsas e mercados e corretores e agentes de seguros, de previdência complementar e de saúde. Vidal Velho explica que o setor financeiro compõe cerca de 63% desses “outros serviços”, seguido por 32% de um subgrupo que contempla, entre outros, saneamento, tratamento de água e gestão de esgotos. A participação toma como base a pesquisa anual de serviços do IBGE de 2017. Os “outros serviços”, diz ele, representam cerca de 7% da PMS.

Luana, do Ibre/FGV, avalia que tanto o grupo de serviços às famílias quanto o de transportes devem intensificar queda em abril, o que deverá ser fenômeno generalizado na PMS do mês. Ela ressalta que o grupo de informação e de comunicação, embora heterogêneo, poderá ter contribuição “menos negativa” em abril contra março em relação aos demais grupos, principalmente por causa do subgrupo de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), demandado no suporte ao trabalho em home office e em novos serviços a distância que têm ganhado mais força com a pandemia.

Ainda segundo o IBGE, em março, a receita nominal do setor de serviços caiu 7,3% na margem e também deve piorar nos meses seguintes. Em 12 meses até março, o volume de serviços registra alta de 0,7%, acumulando retração de 0,1% nos três primeiros meses do ano, ante igual período de 2019.

Para Rodrigo Lobo, do IBGE, a longevidade da crise no setor de serviços, que avança sobre seu terceiro mês, indica recuperação “com ritmo muito lento” no pós-pandemia. Para o especialista, ao tempo em que muitos empresários não conseguirão restabelecer seus negócios depois da crise, o poder de compra das famílias também estará deprimido em razão da redução de renda e desemprego, em um movimento que vai se retroalimentar gerando pouca atividade econômica.