Investimentos com recursos do Fundo são necessários para evolução de padrões sanitários e geram empregos

Claudio Bernardes – Folha de São Paulo

19.ago.2019 às 2h00

O FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) foi criado pela Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, em substituição à estabilidade decenal no emprego para proteger o trabalhador demitido sem justa causa. O Fundo é constituído de contas vinculadas, abertas em nome de cada trabalhador, e com recursos que não são abatidos do seu salário, mas depositados pelo empregador em seu nome.

A Lei estabeleceu que os recursos fossem atualizados monetariamente e remunerados a uma taxa de juros anual inicial de 3%, que seria elevada proporcionalmente ao tempo de permanência do trabalhador na empresa até atingir 6% ao ano para os trabalhadores que permanecessem mais de 10 anos na mesma empresa.

A Lei n° 5.107/1966 foi revogada pela Lei n° 7.839, de outubro de 1989, e ao mesmo tempo em que estabeleceu o limite de remuneração das contas criadas após setembro de 1971 em 3% ao ano, eliminando a remuneração de juros progressiva, criou a vinculação da aplicação dos recursos do FGTS em habitação, saneamento e infraestrutura urbana. Essa mesma Lei introduziu a possibilidade de o trabalhador utilizar os recursos depositados em seu nome, além dos saques em casos específicos, como demissão sem justa causa, extinção da empresa, aposentadoria e falecimento e para o pagamento de parte das prestações de financiamentos no âmbito do SFH (Sistema Financeiro da Habitação).

Atualmente, o FGTS é regulado pela Lei n° 8.036, de 11 de maio de 1990, com suas alterações posteriores, mantidos, todavia, os pressupostos básicos de vinculação da aplicação dos recursos do Fundo e sua remuneração.

Porém, será que o trabalhador está sendo prejudicado por ver limitada a possibilidade de dispor dos recursos depositados em seu nome pelo empregador para melhorar sua remuneração?

A verdade é que o limite na remuneração do saldo das contas possibilita que os recursos do FGTS possam ser utilizados para financiar unidades habitacionais com menores taxas de juros, beneficiando os próprios trabalhadores com renda mais baixa. Essas pessoas não teriam possibilidade de adquirir a casa própria se as taxas de juros fossem as de mercado.

É necessário que as regras do Fundo beneficiem seus cotistas. Segundo relatório da Caixa Econômica Federal, que gerencia as contas do FGTS, em 2017, aproximadamente 85% das contas tinham até um salário mínimo de saldo.

Um aumento de três pontos percentuais, por exemplo, na taxa de juros remuneratórios dos recursos do Fundo implicaria em um aumento proporcional nas taxas de juros do financiamento aos mutuários. Esse aumento resultaria em elevação aproximada de 40% no valor das prestações em um financiamento com prazo de 30 anos, retirando de milhares de trabalhadores a capacidade de comprar imóveis.

É necessário mencionar que os investimentos em saneamento e infraestrutura com recursos do Fundo, além de extremamente necessários para a evolução dos padrões sanitários em nossas cidades, principalmente nos locais onde moram pessoas mais pobres, geram emprego e renda, beneficiando, portanto, os trabalhadores de forma direta e indireta.

Mecanismos que possam melhorar a rentabilidade dos recursos depositados nas contas dos trabalhadores serão sempre bem-vindos. Contudo, aumentar a possibilidade de saques, ou implantar modelos que possam dificultar ou desvincular a aplicação de recursos nas áreas específicas e determinadas, tem efeitos positivos apenas a curtíssimo prazo na dinamização da economia e benefícios limitados ao trabalhador.

A contrapartida seriam consequências extremamente adversas, geradas pelo comprometimento da capacidade do Fundo em desempenhar as funções colaterais para as quais ele foi desenhado, e que têm sido tão importantes do ponto de vista social nas ultimas décadas.

Claudio Bernardes

Engenheiro civil e presidente do Conselho Consultivo do Sindicato da Habitação de São Paulo. Presidiu a entidade de 2012 a 2015.