Por Silvia Rosa e Sérgio Tauhata –  Valor Econômico

Com a queda da taxa básica de juros para 6,5% e a mudança do perfil de atuação do BNDES, a participação do mercado de capitais no financiamento das empresas deve se tornar cada vez mais relevante. O total do estoque em títulos privados em relação ao PIB era de 26,8% em 2017 e a perspectiva é que alcance 38,7% do PIB em cinco anos. Só o total levantado na renda fixa neste ano até junho representa um volume 3,6 vezes maior do que o liberado pelo BNDES no período.

No primeiro semestre, o volume captado por meio de títulos privados alcançou R$ 99,968 bilhões. No mesmo período, o BNDES desembolsou R$ 27,8 bilhões. “Já é crescente a participação do financiamento privado, mas é preciso expandir esse mercado”, diz Gilson Finkelsztain, presidente da B3. O crescimento do crédito privado no financiamento de longo prazo, diz Finkelsztain, passa pelo aperfeiçoamento do arcabouço regulatório para permitir a participação de um número maior de investidores.

Um dos desafios é atrair estrangeiros e fundos de pensão para esse segmento. Esses investidores já têm participado de emissões de debêntures de infraestrutura, como a da Celse neste ano. Mas maior segurança jurídica, que permita clareza em relação a preços e condições nos contratos de concessão, e fortalecimento das agências reguladoras, com mais autonomia, ajudariam a trazer novos participantes, afirma José Eduardo Laloni, diretor da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Outra questão para ampliar a participação do estrangeiro é criar mecanismos para redução do risco cambial das transações. O modelo adotado nas últimas concessões de aeroportos e rodovias previa uma parte da receita em dólar. O governo ainda discute outros mecanismos como a criação de um seguro para o projeto, que seria oferecido pelo Fundo Garantidor de Infraestrutura, administrado pela Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF). Os bancos, assim, teriam mais segurança em oferecer hedge cambial aos investidores.

Os investidores estrangeiros, assim como fundos de pensão e pessoas físicas, já contam com benefício fiscal para investir em debêntures de infraestrutura. A participação das entidades fechadas de previdência nessas ofertas, contudo, ainda é tímida comparada ao potencial de investimento dos institucionais.

Segundo a Anbima e a B3, algumas medidas podem contribuir para isso como, por exemplo, permitir que os fundos de pensão adquiram ativos emitidos por Sociedades de Propósito Específico (SPEs), sejam companhias abertas ou fechadas.

Conforme as entidades, o BNDES tem papel importante como parceiro do mercado de capitais. Para isso, é importante, segundo Finkelsztain, da B3, que não haja retrocessos na atual política estratégica do banco. No passado, lembra, o órgão estatal ampliou o crédito justamente para empresas que tinham condições de buscar recursos no mercado de capitais. “Não podemos insistir no erro de usar bancos públicos para fomentar o crescimento do mercado e atuar como o único financiador das companhias.”  “O BNDES hoje tem atuado junto com o mercado de capitais, compartilhando as garantias [dadas nos empréstimos] e sendo âncora nas ofertas de fundos de infraestrutura e de debêntures, ajudando a atrair investidores para o mercado”, diz Sérgio Goldstein, presidente do Comitê de Finanças Corporativas da Anbima. “O banco tem uma capacidade maior do que qualquer outro para entender os projetos e sua chancela funciona como um selo de qualidade”, afirma.

A ampliação da base de investidores requer também a melhora no acesso às informações pelos investidores. A Anbima e a B3 vêm investindo tanto em educação financeira quanto na certificação dos profissionais e entidades dos mercados. A Anbima também trabalha no lançamento do Sistema de Consulta de Debêntures, que visa disponibilizar o acesso a documentos dos emissores de títulos do gênero em uma só plataforma. Do lado da B3, há ainda um esforço para melhorar o acesso e a qualidade das informações sobre preços e negócios no mercado de renda fixa.