Por Carla Araújo e Daniela Chiaretti – Valor Econômico

10/12/2018 – 05:00

Enquanto tenta se distanciar da polêmica sobre as movimentações de R$ 1,2 milhão na conta de um ex-assessor do seu filho, o senador eleito Flávio Bolsonaro, o presidente eleito Jair Bolsonaro anunciou ontem o último ministro de seu primeiro escalão: o advogado Ricardo Salles, que comandará o Meio Ambiente. Salles, anunciado pelo twitter, viajar hoje para Brasília para assistir a diplomação de Bolsonaro como presidente eleito, no Tribunal Superior Eleitoral.

Presidente do movimento Endireita Brasil (MEB), candidato derrotado a deputado federal pelo partido Novo, Salles foi secretário estadual do Meio Ambiente de São Paulo, de 2016 a 2017, e secretário particular do ex-governador e presidenciável tucano derrotado nas últimas eleições, Geraldo Alckmin. Sua gestão, polêmica, gerou uma ação por improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público de São Paulo, em razão da demarcação de uma área de preservação ambiental no rio Tietê. Ele foi denunciado por ter supostamente fraudado mapas que embasaram o plano de manejo da área. Salles será o único paulista no primeiro escalão do governo.

Ao Valor, ele negou que a indicação tenha algum tipo de compromisso com a bancada do Novo. Ele teve o apoio de entidades do agronegócio para ficar com a vaga. O futuro ministro recebeu na eleição 36,7 mil votos, em uma campanha em que defendeu o armamento da população rural “contra a bandidagem no campo”. Salles afirmou que o processo não o preocupa. Para Salles, a ação é motivada por divergências técnicas. “Essa foi uma ação ajuizada pelo MP por não concordar com as medidas que nós tomamos na secretaria justamente para preservar as leis, preservar a segurança jurídica e respeitar todos os setores produtivos”, disse. “O MP tem uma visão sobre o que foi feito na APA do Tietê e nós na secretaria (do Meio Ambiente) tivemos outra e continuamos defendendo que o que foi feito é o correto e necessário”, completou.

Questionado sobre qual será sua principal bandeira frente à pasta, Salles disse que sua “missão” vai ser desenhada no processo de transição, mas que o seu objetivo “é cuidar do meio ambiente, que é um valor inegociável, mas, por outro lado, respeitar todos os setores produtivos, com o apoio da lei, da boa técnica e sem ideologia”.

A indicação provocou repercussões negativas entre ambientalistas, como a de Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima (OC),a mais importante rede de ONGs do país na agenda de mudanças climáticas. “É o primeiro ministro desde o governo Sarney que não tem compromisso com a agenda ambiental”, disse ao Valor. “Tende a ter um papel figurativo, servindo à agenda de sua vizinha de Esplanada, a futura ministra da Agricultura (Tereza Cristina)”, seguiu Rittl, referindo-se a Tereza Cristina, deputada pelo DEM do Mato Grosso do Sul e atual líder da bancada ruralista. Em nota à imprensa, o OC afirmou que Salles, definido como “ruralista”, era o “o homem certo no lugar certo”, para chefiar “o que sobrar do Ministério do Meio Ambiente”. “O presidente eleito, afinal, já deixou claro que enxerga a agenda ambiental como entrave e que pretende desmontar o Sistema Nacional de Meio Ambiente”, diz a nota. Também por nota, o coordenador de políticas públicas do Greenpeace, Márcio Astrini, disse que “Bolsonaro já deixou claro que deseja reduzir o Ministério do Meio Ambiente a uma espécie de subsede do Ministério da Agricultura”.

A organização WWF-Brasil reagiu à indicação lembrando que trata-se de uma “pasta estratégica para o Brasil avançar com urgência como um país que busca o desenvolvimento sustentável”. “Desejamos que o Ministério do Meio Ambiente cumpra sua missão de balancear as questões ambientais nas outras pastas do governo”, disse Mauricio Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil. Em nota à imprensa, o atual ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, que participa da CoP 24 – a rodada de negociações climáticas que se desenvolve em Katowice, na Polônia, disse que Salles terá “o enorme desafio de promover o desenvolvimento sustentável e a proteção do maior patrimônio do Planeta”.