Valor Econômico
14/05/2021  

Por Francisco Góes e Alessandra Saraiva

Gustavo Montezano, presidente do BNDES, defende que banco aloque mais capital e risco na ‘ponta’

O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, defendeu ontem que a instituição de fomento aloque mais risco e capital “na ponta”, em projetos de infraestrutrura e no setor rural. O executivo expôs o argumento ao apresentar os resultados do BNDES no primeiro trimestre de 2021, quando o banco registrou lucro líquido de R$ 9,8 bilhões, 78% acima de igual período de 2020. O desempenho foi determinado por fatores extraordinários, em especial a venda de ações de Vale e de Klabin. A JBS também contribuiu para o resultado. O banco possui 22,17% do capital da empresa de proteína animal e reconhece o resultado dessa participação via equivalência patrimonial no balanço contábil.

A fala de Montezano indica um movimento duplo do BNDES: ao mesmo tempo em que esvazia a carteira de participações acionárias, pretende alocar mais capital e risco em projetos que considera trazer mais benefícios socioambientais ao país, como é o caso, por exemplo, do saneamento. “Temos que alocar nosso capital e [fazer] a alocação de risco mais diretamente na ponta, seja em projeto de infraestrutura ou no setor rural como fizemos recentemente. Tomar risco de forma controlada, bem administrada, desenvolve o país. Alocar risco em especulação financeira é mau uso do nosso capital.”

Sem citar nomes ou governos anteriores, criticou: “Por quase duas décadas, o banco foi monopolista e distribuidor de subsídios econômicos vultuosos, o banco tinha aversão a risco relevante.

O BNDES tinha em 10 de maio carteira de ações de R$ 70 bilhões, abaixo dos R$ 81,8 bilhões de 31 de dezembro de 2020. Poucas ações representam a maior parte da carteira de renda variável. São elas: Petrobras, JBS, Eletrobras e Copel, entre outras. A BNDESPar, empresa de participações do banco, informou à Copel que aprovou, em conselho de administração, a venda da fatia que possui na companhia elétrica. O diretor de mercado de capitais do BNDES, Bruno Laskowsky, disse que o banco vai esperar o melhor momento para a venda. O BNDES tem 23,96% do capital da Copel.

A venda da carteira de ações da BNDESPar é um dos principais objetivos da administração Montezano desde que assumiu o cargo, em meados de 2019, depois da saída de Joaquim Levy. No primeiro trimestre de 2021, a venda das participações societárias contribuíram com R$ 10,6 bilhões para o resultado. A contribuição de JBS, via equivalência patrimonial, foi de R$ 1 bilhão. Excluindo-se os eventos extraordinários, caso da venda de ações e o provisionamento para risco de crédito, o lucro líquido recorrente do BNDES, de janeiro a março, foi de R$ 2,4 bilhões, 1% abaixo de igual período de 2020.

O banco também informou que a carteira de crédito expandida chegou a 31 de março em R$ 460,1 bilhões, estável em relação há um ano. Os desembolsos de recursos no trimestre somaram R$ 11,3 bilhões, com alta de 35% em relação ao primeiro trimestre de 2020, e a inadimplência de 90 dias, referência para o setor bancário, ficou em 0,04%, acima do 0,01% do quarto trimestre, mas ainda assim abaixo da média do Sistema Financeiro Nacional, de 2,19% em 31 de março, segundo o próprio BNDES.

Montezano disse que cerca de 55% do risco alocado na carteira de crédito do BNDES é de outras instituições, que operam como agentes da instituição de fomento ou de operações que contam com o aval da União. O objetivo, disse, é incrementar a tomada de risco e a exposição do capital do BNDES a projetos que tragam desenvolvimento para o país. Citou como exemplo projetos que têm a receita futura a ser gerada pelo empreendimento como garantia do empréstimo, o que na indústria bancária é chamado de “project finance”. “É fundamental que o banco dê esse passo na assunção de mais risco de projeto, temos capital e expertise”.

Ele disse que a retomada sustentável da economia passa por um tripé formado por disciplina fiscal, a “âncora” que mantém o juro sob controle; um bom ambiente regulatório, via estabilidade de leis e um Congresso “reformista”; e a execução de bons projetos. Afirmou que o banco divide a alocação de risco em grandes projetos para infraestrutura e no apoio a micro, pequenas e médias empresas.