Por Francisco Góes – Valor Econômico

27/11/2018 – 05:00

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deve acelerar os desembolsos em novembro e dezembro e, dessa forma, espera manter a previsão de liberar neste ano cerca de R$ 70 bilhões, número semelhante aos R$ 70,8 bilhões de 2017, a valores constantes. Para 2019, a área de planejamento do BNDES trabalha com empréstimos de R$ 90 bilhões, número que considera um cenário de 2,5% de alta do Produto Interno Bruto (PIB).

Apesar da recuperação esperada para os últimos meses de 2018, o número do desembolso previsto para este ano vai fazer com que o banco volte aos nível de 1999, 20 anos atrás, quando o BNDES emprestou R$ 70,4 bilhões, também a valores constantes [ver quadro abaixo]. O pico de desembolsos desse período foi 2010, ano em que o banco emprestou R$ 275,6 bilhões, ainda sob o impulso do crédito barato do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). O piso da série histórica, em comparação, foi em 1995, com R$ 40 bilhões de desembolsos.

A estimativa de atingir os R$ 70 bilhões de desembolsos em 2018 não parece ser tarefa fácil, na visão de observadores do banco. Isso porque de janeiro até setembro o desembolso do BNDES somou R$ 44 bilhões, queda de 16% sobre igual período do ano passado. A maior retração acumulada em nove meses de 2018 foi a da indústria, com recuo de 27% nos desembolsos, seguida de

comércio e serviços, com 19%. Os números fechados do banco no ano devem ser conhecidos somente em janeiro.

Fontes do BNDES argumentam, porém, que a perspectiva de recuperação no volume de desembolsos se apoia no fato de que, histórica e sazonalmente, o banco costuma liberar um maior volume de recursos nos últimos meses do ano, em especial em novembro e dezembro. Para o ano que vem, a questão, além do crescimento da economia, é saber qual será o papel que o novo governo vai querer imprimir ao BNDES.

De acordo com fontes que acompanham as discussões da equipe econômica do presidente eleito, Jair Bolsonaro, os sinais, até agora, são mais de continuidade do que vem sendo feito no BNDES, no governo Temer, do que propriamente de uma “ruptura”. O futuro presidente do BNDES, Joaquim Levy, se reuniu, na semana passada, com o presidente do banco, Dyogo de Oliveira, e ambos devem voltar a se encontrar na primeira semana de dezembro, no Rio, depois do G-20, em Buenos Aires, na sexta e no sábado, onde ambos estarão presentes.

Levy já está informado sobre os dados, os grandes números e as iniciativas atuais desenvolvidas pelo BNDES, que, sob a gestão de Dyogo, priorizou obter maior eficiência operacional, reduzindo custos e prazos para concessão de financiamentos, o que passa pela estratégia do banco na área digital. Ontem, o BNDES fez um evento sobre fintechs em sua sede, no centro do Rio, com o objetivo de fomentar soluções inovadoras em termos de análise de crédito, integração do banco a plataformas digitais e digitalização de todo o processo de concessão de crédito, entre outras iniciativas.

Em 2018, o BNDES deverá terminar o ano emprestando cerca de metade dos seus recursos para micro, pequenas e médias empresas e cerca de 40% para a área de infraestrutura. De acordo com fontes, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, tem preocupação com outro tema: a devolução de recursos do banco ao Tesouro Nacional. Levy, por sua vez, está focado na sustentabilidade financeira do BNDES; em outras palavras, que o banco tenha condições de andar com as próprias pernas, operando com seu caixa e fazendo captações no mercado, sem precisar da ajuda do Tesouro. Mesmo sem precisar, o banco tem feito algumas captações como forma de se mostrar ativo nesse mercado.

Para 2019, a previsão de estudo publicado pelo BNDES é que o banco devolva ao Tesouro R$ 26,6 bilhões. Na avaliação de fontes próximas ao banco, há espaço para que o banco faça, no ano que vem, uma devolução adicional ao Tesouro em relação aos valores já acertados, mas isso vai depender basicamente de dois fatores. Um deles é justamente a recuperação econômica, o que determina a maior ou menor demanda por recursos do banco. O outro fator é o tamanho do BNDES no novo governo.

Há quem entenda que não estaria nos planos de Levy ou de Guedes transformar o BNDES em um banco “minimalista”.

Essa visão leva em conta que há investimentos na área de infraestrutura, como mobilidade urbana, saneamento e geração de energia elétrica, que precisam ser alavancados com a participação do BNDES, considerando os montantes, os riscos e os prazos envolvidos, que são de longa maturação. Outra questão a ser enfrentada por Levy é a venda de ativos da carteira da BNDESPar, o braço de participações acionárias do BNDES. O banco tem posições importantes em empresas como a produtora de proteínas JBS, na Petrobras e na Vale. A visão, no banco, é que a venda precisa ocorrer na “hora certa”, apoiando-se em critérios técnicos, e não políticos.

A decisão sobre a venda de papéis da carteira de renda variável do banco se vincula também à questão da transparência, aspecto que a gestão de Dyogo buscou consolidar no BNDES como um todo. Bolsonaro já disse, no Twitter, que pretende abrir a “caixa-preta” do BNDES, referindo-se a uma possível devassa que o novo governo faria no banco de fomento. Na instituição, o corpo técnico considera que o banco foi submetido, nos anos recentes, a um escrutínio que envolveu três comissões parlamentares de inquérito (CPIs) no Congresso, uma investigação da Polícia Federal sobre o apoio do banco à JBS e 88 processos administrativos no Tribunal de Contas da União (TCU). Não houve até agora funcionários do banco denunciados pela Justiça. No caso JBS, houve o indiciamento de um ex-superintendente, que está licenciado.

Hoje o BNDES e o TCU promovem encontro conjunto na sede do tribunal, em Brasília, quando será assinado um acordo de cooperação técnica para disciplinar o intercâmbio de informações entre as duas instituições.