Valor Econômico
27/01/2020

Por Arícia Martins

Segmento deve desacelerar após três anos subindo acima da média do IPCA

A inflação deve contar com uma ajuda extra neste ano, além da ociosidade na economia, que inibe reajustes de preços livres, e da dissipação do choque de proteínas. Economistas também veem um cenário bastante tranquilo para as tarifas administradas, que aumentaram 5,5% no ano passado e, em 2020, devem desacelerar para cerca de 3,5%. Esse é um dos fatores que devem fazer com que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) suba menos que a meta, de 4%. Com participação de cerca de 25% no IPCA, fazem parte dos preços administrados itens como gasolina, diesel, energia residencial, plano de saúde, medicamentos, transporte público, água e esgoto e gás, entre outros. Em comum, todos têm correções determinadas ou influenciadas por órgãos públicos, sem relação com as condições de oferta e demanda, segundo definição do Banco Central.

Nas estimativas do BC, divulgadas no Relatório Trimestral de Inflação de dezembro, os preços monitorados, como também são chamados, terão alta de 3,6% este ano. Nesse conjunto de itens, diz o BC, “destaca-se a presença de condições benignas para a ocorrência de reajustes menores nas tarifas de energia elétrica, que já vêm se materializando nos últimos meses e devem prosseguir nos trimestres seguintes.”

Pela mesma razão, o Itaú Unibanco reviu, de 3,5% para 3,3%, a projeção para o aumento do IPCA no ano, já considerando avanço de 3,5% para os preços monitorados. Segundo Júlia Passabom, economista do banco, a tendência é que esses itens tenham evolução mais parecida com os preços livres, depois de três anos subindo acima da inflação total.

Neste ano, o principal alívio deve vir da tarifa de eletricidade residencial, que tem peso de 4,1% no IPCA, diz ela. Em seus cálculos, as contas de luz vão subir apenas 2% dentro do indicador, vindo de avanço de 5% em 2019. Em setembro, foi quitado antecipadamente o empréstimo bilionário chamado “conta-ACR”, cobrado dos consumidores desde 2014, quando distribuidoras enfrentavam dificuldades financeiras devido à crise hídrica.

A antecipação da liquidação, que seria feita agora em abril, já moderou a alta das tarifas de 2019 e vai contribuir ainda mais com os preços este ano, afirma Julia. Na previsão de 2%, o Itaú trabalha com manutenção da bandeira tarifária amarela, com impacto neutro no índice.

Outros componentes importantes do conjunto de administrados além das contas de luz também já sinalizaram alta menor este ano. Para Leonardo França Costa, economista da Rosenberg Associados, um destaque de perda de fôlego é a parte de transporte público, que deve desacelerar de 5,5% para 2,3% entre 2019 e 2020. O calendário eleitoral, com pleito nas prefeituras, inibe reajustes muito altos das passagens de ônibus e outros modais, observa Costa, a exemplo de São Paulo.

Na capital paulista, as tarifas de ônibus, metrô e trem metropolitano foram reajustadas em 2,33% a partir de janeiro, percentual abaixo da inflação anual de 2019, de 4,31%. No Rio, segunda capital de maior peso no IPCA, as passagens ainda não subiram, mas devem ser corrigidas a partir de fevereiro. “Teremos uma desaceleração grande nesse grupo”, disse o economista, que prevê aumento de 3,9% para os preços administrados este ano.

Ainda dentro dos transportes, a expectativa é que os preços da gasolina não incomodem em 2020, apesar da tensão entre EUA e Irã que pressionou o dólar e a cotação do barril de petróleo neste início de ano. O combustível ainda faz parte do grupo de preços administrados, mas a política de preços da Petrobras tem refletido as condições de mercado, ao repassar as oscilações do câmbio e dos preços internacionais do combustível.

Carlos Thadeu de Freitas Filho, economista-chefe da Ativa Investimentos, projeta aumento de apenas 0,4% da gasolina este ano, com avanço de 3,1% dos administrados. A taxa média de câmbio deve ficar praticamente estável, passando de R$ 4,17 para R$ 4,20 entre o ano passado e o atual, estima ele. Para o restante do grupo de monitorados, a premissa é que o quadro de inflação sem pressões dos últimos anos reduz a indexação, diz.

Já os planos de saúde, que respondem por 4,5% do IPCA, também devem perder fôlego este ano, após altas na casa de dois dígitos de 2015 a 2018 e de 8,2% em 2019, acrescenta Julia. Nesse caso, explica ela, a ajuda virá da mudança de metodologia para calcular o índice de reajuste. O teto de correção para planos com aniversário entre maio de 2019 e abril de 2020 foi estabelecido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em 7,35%. Pela primeira vez, esse percentual foi definido com base em uma fórmula que combina a alta do IPCA, excluindo planos de saúde, e os gastos das operadoras com hospitais e médicos. Mas parte desse custo é abatida conforme a eficiência operacional da operadora, o que resulta em redução do índice de reajuste.