Por Fabio Giambiagi – Valor Econômico

06/02/2019 – 05:00

Dou continuidade a um texto que publiquei neste espaço em 9/8/2017. As opiniões aqui expostas são pessoais, mas as ideias são oriundas do Texto para Discussão 133 do BNDES (“Os bancos de desenvolvimento e o papel do BNDES”) de 2018, em coautoria com Breno Albuquerque, Daniel Grimaldi e Ricardo de Menezes Barboza.

O assunto tem antecedentes longínquos. Em 1994, era comum considerar que, devido à estabilização, haveria um desenvolvimento do mercado de capitais que diminuiria o papel do BNDES. A realidade, depois, tomou outros rumos.

Contudo, um quarto de século depois, o cenário de inflação e juros baixos permite aspirar a um mercado de capitais mais pujante, motivando nova reflexão acerca do tema.

Na atual década, as críticas à atuação do banco se intensificaram. O que, por sua vez, contribuiu para que, desde a mudança ocorrida no país e no BNDES em 2016, a instituição passasse por uma fase de reflexão e de transformação.

Vários bancos de desenvolvimento, incluindo o Banco Mundial e o BID, enfrentaram esse processo. Esse movimento é saudável. Foi a partir desses questionamentos que tais instituições se modernizaram, tornando-se mais preocupadas com seus custos e sua efetividade, tanto em países desenvolvidos quanto em economias emergentes. A arte consistiu em serem flexíveis e apoiar de forma eficaz os gover nos para lidar com eventuais falhas de mercado.

O BNDES pertence ao Tesouro – ou seja, pertence a todos – e, portanto, precisa mostrar como atua e com que objetivos,

atendendo às necessidades de uma sociedade que exigirá cada vez mais dos agentes públicos. Prestar contas de forma satisfatória é uma tarefa chave que instituições de natureza similar devem encarar e para a qual, diga-se de passagem, o BNDES mudou muito, na direção certa, nos últimos 3 a 4 anos.

Resumo os principais itens abordados no texto, que condensam nossas reflexões sobre o futuro do banco. Mesmo entendendo que não deve haver um modelo único, são pontos que podem ser uma espécie de “decálogo”, na forma de um road map para a atuação do BNDES e que, cabe destacar, em muitos casos, já estão sendo colocados em prática:

1- o BNDES deve ter sua atuação baseada na lógica de custos e benefícios sociais, direcionando suas intervenções às situações em que o retorno social é superior ao retorno privado, mesmo reconhecendo que, na prática, a avaliação detalhada disso não é trivial;

2- o BNDES futuro terá que ser uma instituição focada prioritariamente no apoio a) à infraestrutura; b) às micro e pequenas e, particularmente, às médias empresas (MPMEs) em situações em que estas enfrentam restrições de acesso; c) às atividades de inovação; e d) a algumas ações tipicamente governamentais (com destaque para saúde, educação e segurança);

3- é preciso aumentar o papel do setor privado na oferta de serviços públicos e avançar nas concessões. O banco pode desempenhar um papel relevante nisso, colaborando com sua expertise técnica na privatização e, quando demandado, fornecendo apoio financeiro aos investimentos nos setores envolvidos;

4- o estímulo à competição deve ser um ponto importante. O banco tem que ser parte do que deveria se transformar numa obsessão: o aumento da produtividade, sem o que, no contexto do envelhecimento demográfico, o Brasil será um fracasso;

5- é necessário aprimorar as formas alternativas de atuação. O banco deve agir em áreas onde houver restrições de crédito (p.ex., apoio à média empresa), mas também em outras modalidades que não financiamento, tais como garantias, que podem ser devidamente alavancadas;

6- cabe, cada vez mais, monitorar e avaliar os resultados das políticas. Nesse sentido, a criação de um Departamento que trata dessa temática, em 2016, bem como a formalização dos processos ligados a essas atividades e a divulgação recente do Relatório de Efetividade em 2018, foram passos corretos no processo de aperfeiçoamento da instituição;

7- o banco tem um papel potencial como elemento coordenador das ações de governo em diversos setores, pela sua perspectiva privilegiada acerca dos diversos investimentos que podem ocorrer na economia;

8- é muito importante que o banco amplie sua atuação no apoio à educação, assunto crucial para o desenvolvimento do país;

9- o BNDES pode atuar como parceiro dos bancos, induzindo seu avanço rumo a uma maior oferta de crédito de longo prazo, além de atuar como agente de fortalecimento do mercado de capitais, notadamente no campo da infraestrutura; e

10- transparência e diálogo serão cada vez mais críticos. O BNDES já passou a disponibilizar nos últimos anos, em seu site, uma série de informações acerca de cada um dos seus empréstimos, para livre acesso por qualquer cidadão. Além disso, canais de comunicação, divulgação de dados de desempenho e publicação de documentos contendo objetivos e avaliação de políticas, têm sido meios para atender a ansiedade da sociedade por respostas e participação. Será preciso continuar a trilhar esse caminho.

Fabio Giambiagi é economista-chefe do BNDES e escreve mensalmente neste espaço. E-mail:

fgiambia@terra.com.br.