Valor Econômico
07/11/2019

Por Lucas Hirata e Victor Rezende

Perspectiva de que atual ciclo de corte se aproxima do fim dá força à estratégia de embolsar lucros das posições de curto prazo e migrar para horizontes um pouco mais longos

Mesmo com o intenso afrouxamento monetário que trouxe a Selic de 14,25% em 2016 para os atuais 5% ao ano, profissionais de grandes instituições financeiras ainda enxergam oportunidades de ganho na renda fixa. Agora, a perspectiva de que o atual ciclo de corte de juros se aproxima do fim dá força à estratégia de embolsar os lucros das apostas de curto prazo e migrar para investimentos de horizontes um pouco mais longos, especialmente entre dois e cinco anos.

O mundo com as taxas negativas se espalhando pelas economias desenvolvidas torna essas possibilidades de retorno ainda mais atraentes, destacam os profissionais. A NTN-B para 2024, por exemplo, ainda paga 2% ao ano além da inflação. Já o contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 está em 6,12%, cerca de 1,6 ponto percentual acima do vencimento de 2021.

Além dos juros de médio prazo ainda serem atrativos, uma certa confiança do investidor na continuidade desse ambiente de juro baixo e inflação controlada também estimula a migração.

Não fosse essa visão positiva, o mercado seguiria exigindo prêmios mais altos para alongar suas posições, o que parece não ser o caso neste momento.

Essa visão fica clara no comportamento do mercado ontem. Mesmo com o salto do dólar em decorrência da frustração com a participação de estrangeiros no megaleilão de petróleo da cessão onerosa, a aposta em juros baixos foi preservada. As taxas de curto prazo dos DIs terminaram o dia praticamente estáveis. O contrato para janeiro de 2021, por exemplo, ficou em 4,49%.

A passos lentos, uma migração para os contratos de prazo mais longo já começou a acontecer. Economista do Bradesco BBI, Altair Pereira nota que, na semana passada, a diferença entre as taxas de longo prazo e as de curto prazo dos títulos públicos – a chamada inclinação da curva – já teve uma queda notória. “A diferença entre a NTN-F 2029 e a 2021 encerrou a semana passada em 108 pontos-base, queda de 16 pontos-base em relação à semana anterior”, afirma.

Nos últimos dias, a necessidade de ajuste nas carteiras ficou ainda mais evidente depois que o Copom começou a soar mais cauteloso quanto à continuidade do ciclo de afrouxamento, após garantir mais um corte de 0,50 ponto percentual da Selic em dezembro, de 5% para 4,5%. Para analistas, isso significa que o juro básico tem pouco espaço para quedas adicionais e tende a ficar sem grandes movimentos por algum tempo, o que deixa as operações com taxas de curto prazo mais restritas.

“É importante deixar claro que a assimetria para baixo nos juros está perto do fim”, diz Sergio Silva, responsável pelos fundos macro da AZ Quest. Ele afirma que o alongamento é uma das estratégias possíveis para a renda fixa, assim como movimentos no formato da curva ou juros reais. “Isso muda a cada dia, já que o dinamismo e liquidez do mercado nos dão a possibilidade de adequar estratégias. Estamos em um período de reavaliação de cenário.”

O mercado provavelmente debaterá por algum tempo se o discurso do Copom significa uma mudança para cortes mais contidos, de 0,25 ponto percentual, em 2020 ou se significa o fim do ciclo. Os estrategistas Dirk Willer e Kenneth Lam, do Citi, alertam que há pouco prêmio para ser explorado nas negociações com o DI com vencimento em janeiro de 2021.

Já a equipe de estratégia do Deutsche Bank prefere embolsar lucro no contrato de DI para janeiro de 2023, ao observar com bons olhos os vencimentos mais longos. O banco alemão avalia que possíveis contratempos nas reformas representam o principal risco neste momento, mas ressalta que o governo está se encaminhando para desafogar a máquina pública. “Isso dá apoio à nossa visão otimista para a ponta longa da curva [de juros] e, por isso, estamos aplicados no DI para janeiro de 2025.”

O economista-chefe da Bradesco Asset Management (Bram), Marcelo Toledo, afirma que os contratos de curto prazo já pareciam pouco atrativos mesmo antes da decisão do Copom, na semana passada. A gestora começou há algumas semanas um alongamento de suas posições, tanto com juros prefixados quanto em títulos atrelados à inflação. A ideia agora é se posicionar em prazos de dois a cinco anos.

“Há algumas semanas, quando a precificação [no mercado futuro] para o nível da Selic chegou a 4,25%, a gente preferiu alongar um pouco as posições”, diz Toledo. Ele explica que a nova posição na gestora tende a ganhar tanto num cenário de alguma queda adicional da Selic quanto num quadro de juros baixos por mais tempo. “É muito mais por esse motivo do que qualquer visão que há risco de surpresa desfavorável com inflação.”

A Bram mantém a projeção de Selic a 4,5% a partir de dezembro de 2019, com alguma normalização da política monetária só em 2021. Para Toledo, o cenário de Selic abaixo de 4% é menos provável, mas o Copom vai ter tempo para observar a economia e decidir seus próximos passos.

“O cenário de juros baixos por mais tempo vai levar a mudança gigantesca na alocação de recursos de todos os investidores. E o maior efeito será uma redução nas posições em renda fixa ou uma estratégia mais arrojada para o segmento”, diz Fernando Lovisotto, sócio da Vinci Partners, que trabalha com cenário de estabilidade da Selic em 4,5% ao longo de 2020.

 Com isso, o investidor deve ver menos atratividade em se posicionar em juros nominais de curto prazo, que já renderam bons ganhos nos últimos anos. Assim, uma migração para juros mais longos, títulos atrelados à inflação ou crédito corporativo fica mais interessante.

“Estamos buscando um equilíbrio entre carrego e ganho de capital, de forma que o alongamento tem sido consequência de oportunidades. Aceitamos o risco do prazo maior desde que a inclinação, isto é, uma remuneração extra, seja satisfatória. Isso vale para o crédito e para títulos públicos”, diz o diretor de investimentos da Sparta, Leonardo Hort.