Estadão
26/11/2019

Por Henrique Soares Melo*

A Medida Provisória nº 905/2019, considerada como uma segunda rodada da reforma trabalhista de 2017, trouxe importantes impactos econômicos para as empresas, bem como incremento na segurança jurídica.

Alguns pontos merecem atenção. Embora exista espaço para discutir a constitucionalidade de alguns itens, a nova modalidade de contratação de empregados – o contrato de trabalho verde e amarelo – observadas as condições para a sua celebração, resultará em substancial redução de custos, auxiliando a alavancar determinadas operações ou mesmo servindo como incentivo para expansão de atividades. A redução se dará por meio da aplicação da alíquota de FGTS mensal de 2% (ao invés do percentual normal de 8%), isenção das contribuições ao INSS e ao sistema “s” sobre o valor da remuneração, bem como redução da multa de FGTS para 20% (ao invés dos atuais 40%).

As limitações impostas pela legislação para a contratação de empregados utilizando o contrato de trabalho verde e amarelo (até 20% do total de empregados da empresa, utilização somente para novos postos de trabalho, prazo máximo de 2 anos e aplicação somente para trabalhadores entre 18 e 29 anos, desde que se trate do primeiro emprego) constituem instrumentos eficazes para impedir abusos por parte das empresas na utilização desta modalidade de contratação.

A alteração do índice aplicado para a correção dos débitos trabalhistas para o IPCA-E + juros da poupança implica na redução de valores de provisionamento das empresas, resultando em uma estimativa menor de custos e melhoria nos resultados. Da mesma forma, a extinção da multa de 10% de FGTS (contribuição social) em casos de demissões sem justa causa, acarreta a redução dos custos em caso de desligamentos, bem como diminuição dos valores em provisões contábeis nas empresas.

Embora a utilização de seguros fiança em substituição aos depósitos recursais já fosse admitida na justiça do trabalho (para o caso de novos recursos), ao permitir a substituição de depósitos recursais já realizados por seguro fiança, a MP 905/2019 cria possibilidade de geração de liquidez imediata para as empresas.

Em termos de aumento da segurança jurídica, merecem destaque as alterações à Lei 10.101/2000, especialmente no que se refere ao estabelecimento de um conceito objetivo para que as regras da participação sejam consideradas “previamente estabelecidas” (antes do pagamento da antecipação, quando prevista; e com antecedência mínima de 90 dias do pagamento da parcela única ou da parcela final, quando tenha havido pagamento de antecipação), não obrigatoriedade de participação do sindicato na comissão paritária (observado que o arquivamento do plano no sindicato permanece obrigatório) e (iii) respeito à autonomia da vontade das partes contratantes, a qual prevalecerá em face do interesse de terceiros.

Ainda em relação aos pagamentos variáveis aos empregados, o estabelecimento de critérios claros e objetivos para a concessão dos prêmios sem natureza salarial poderá tornar referida prática mais comum, uma vez que até o momento apenas parte das empresas havia implementado esse tipo de pagamento, dadas as incertezas com relação a sua interpretação.

Fica autorizado o trabalho aos domingos independentemente da previsão em Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho, trazendo maior clareza em relação ao assunto. Vale salientar que os empregados permanecem tendo direito descanso semanal remunerado em outro dia da semana, sendo que o dia do descanso deve coincidir com o domingo a cada 4 semanas para o setor do comércio/serviços e a cada 7 semanas para o setor industrial.

A revogação da equiparação do acidente de trajeto a acidente do trabalho corrige verdadeira distorção existente em nossa legislação, uma vez que tal equiparação impunha ao empregador a responsabilização por acidentes ocorridos em ambiente sobre o qual não possui qualquer ingerência, tais como as vias e transportes públicos.

O estabelecimento de critérios mais claros e objetivos para a fiscalização do trabalho (por ex. com a ampliação do critério da dupla visita), procedimentos para o embargo ou interdição e a celebração de termos de ajustamento de conduta, reflete diretamente em um ambiente com maior segurança jurídica para os negócios.

Embora muitos defendam que as novas regras, por serem supostamente mais brandas, resultarão em aumento do descumprimento da legislação trabalhista, vale mencionar que o aumento substancial nos valores das multas trabalhistas (cuja aplicabilidade ainda depende de ato do poder executivo, estabelecendo a classificação da natureza das infrações, bem como porte econômico das empresas) certamente resultará em maior cautela por parte das empresas, até mesmo porque os antigos valores de multas estavam, em sua grande maioria, defasados.

Caberá agora ao poder legislativo avaliar e ratificar as alterações advindas com a MP 905/2019, de modo que essas não percam sua validade após 120 (cento e vinte) dias da sua publicação.

A ausência de apreciação do tema e a eventual perda automática dos efeitos da medida provisória seria extremamente negativa para o país, tendo em vista a necessidade de estímulos para a recuperação da economia e maior segurança jurídica para os negócios.

Espera-se, assim, que o poder legislativo aprecie a matéria, de modo a possibilitar a conversão da referida medida provisória em lei.

*Henrique Soares Melo, sócio da área trabalhista do NHMF Advogados