Valor Econômico
28/02/2020

Por Marcelle Gutierrez e Ana Carolina Neira

Os mercados acionários seguem pressionados no Brasil e pelo mundo pela onda de aversão ao risco provocada pela disseminação do coronavírus (Covid-19) e incertezas sobre seus efeitos econômicos. O Ibovespa teve nova queda ontem de 2,59%, após já ter recuado 7,00% na quarta-feira

Mesmo com os mercados acionários pressionados, com dois pregões consecutivos de fortes quedas, os grandes investidores se mantêm posicionados em bolsa. Com taxas de juros baixas e perspectiva de crescimento da economia e dos lucros das empresas, os gestores de fundos aproveitaram para trocar alguns papéis da carteira e até comprar mais.

O Ibovespa registrou nova queda ontem de 2,59%, após já ter recuado 7% na quarta-feira. No fechamento, ficou na mínima de 102.984 pontos. Em termos de valor de mercado, as empresas que compõem o índice perderam aproximadamente R$ 356 bilhões em dois dias, segundo levantamento do Valor Data. O montante equivale a uma Petrobras, com valor de mercado de R$ 341,4 bilhões.

Na máxima do dia, o Ibovespa chegou a subir 0,89%, aos 106.656 pontos, suportado pelas ações de bancos, mas voltou para o negativo com a piora nos mercados nos Estados Unidos. Em Nova York, tanto o Dow Jones quanto o S&P 500 caíram 4,42%, cada. O Nasdaq recuou 4,61%. Por lá, os mercados pesaram após a confirmação de 33 novos casos positivos de coronavírus na Califórnia. No Brasil, os casos suspeitos subiram de 20 para 132, com um confirmado.

“Em um movimento desses de forte deslocamento de preços, os gestores normalmente fazem rotação de portfólio, migrando de setores mais arriscados para mais defensivos”, conta Alexandre Hishi, responsável pela gestão de investimentos da Azimut Brasil Wealth Management.

Isso explica o comportamento de muitos fundos nos últimos dias, que optaram por sair de papéis mais expostos aos efeitos do coronavírus, caso das empresas de commodities e do setor aéreo, e comprar ações consideradas de mais qualidade, como bancos. O volume há 3 horas financeiro do Ibovespa ontem mostra essa movimentação forte, de R$ 29,8 bilhões, bem acima da média diária de 2020, de R$ 17,7 bilhões em 2020.

E as principais negociações foram exatamente de papéis apontados pelos profissionais. As ações preferenciais (PN) da Petrobras caíram 3,47% e o giro somou R$ 2,57 bilhões. Na sequência aparecem Itaú Unibanco PN, com uma alta de 0,06% (R$ 1,93 bilhão), os papéis ordinários (ON) da Vale que caíram 1,94%, com volume de R$ 1,89 bilhão, e Banco do Brasil ON, em alta de 1,24% (R$ 1,46 bilhão).

A economista-chefe da Azimut Brasil Wealth Management, Helena Veronese, reforça que neste momento não há clareza da dimensão do impacto do coronavírus para a economia real. “Não dá para dizer que o cenário mudou. Com certeza terá impacto, mas é muito prematuro dizer que vai mudar a tendência para a bolsa.”

Segundo ela, a aversão ao risco está muito maior do que o previsto e não é possível precisar o tempo de duração. “O comportamento da bolsa vai depender da evolução da doença”, diz. Para ela, o pano de fundo não foi alterado, com perspectiva positiva para Brasil e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) entre 1,5% e 2% em 2020.

A gestora de investimentos do Aberdeen Standard Investments, Brunella Isper, corrobora que o cenário continua positivo para o Brasil, mesmo com crescimento aquém do esperado, e que a disseminação do coronavírus terá impacto na expansão do lucro das empresas caso a caso. “As mineradoras de fato serão impactadas pelo preço do minério de ferro e Petrobras com petróleo.”

Diante da visão ainda positiva para economia doméstica, a gestora revela que o Aberdeen está aproveitando para comprar. “A gente acredita que no momento em que os investidores de curto prazo estão vendendo é a nossa chance de comprar Brasil mais barato.”

Alexandre Sant’Anna, gestor de renda variável da ARX Investimentos, também acredita que este não é o momento para sair do mercado de ações. “Buscamos fazer alocação relativa, indo para setores mais blindados contra o avanço da doença e que tenham tido quedas fortes”, explica. Ele cita os setores de seguros, varejo e elétrico como boas preferências da casa, diante da boa perspectiva para a economia interna.