Por Ana Krüger e Rafael Bitencourt – Valor Econômico

21/02/2019 – 05:00

A apresentação da proposta de reforma da Previdência aos governadores serviu como termômetro para o governo federal testar a reação dos políticos e da futura discussão com as bancadas estaduais no Congresso. A reunião aconteceu no Fórum de Governadores. Além de críticas ao texto, o ministro da Economia, Paulo Guedes, deparou-se com a barganha dos Estados por socorro financeiro.

Os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), e do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSL), defenderam com mais ênfase as ações emergenciais como condição ao apoio à reforma.

Os governos estaduais entrarão em situação de ingovernabilidade se o socorro não sair até abril, disse Caiado. Para ele, essa é uma prioridade maior do que a reforma.

Witzel considera “muito difícil” a reforma passar no Congresso sem ajuda da União aos Estados. Ressaltou que, “no curto prazo”, a mudança previdenciária não resolve o problema dos Estados.

O texto foi apresentado aos governadores após o envio ao Congresso, o que desagradou alguns deles. A estratégia fez com que, neste primeiro momento, apenas críticas e sugestões mais superficiais fossem apresentadas.

As críticas mais duras ao texto vieram dos governadores do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB-DF) e do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB). Ibaneis liderará grupo de trabalho criado para discutir as sugestões de ajustes à equipe econômica até o fim de março. Para ele, sem ajustes a reforma não será aprovada no Congresso.

“Posso garantir para vocês, com a experiência que tenho há 25 anos advogando para várias categorias, que aquela proposta não passa. O governo não consegue 50 votos para aprovar aquela medida, mas com os ajustes todos nós temos condições de aprovar até o mês de junho ou julho”, afirmou.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), foi o único a apoiar a reforma como ela foi apresentada. Disse ainda não ter visto nada na proposta capaz de travar a discussão. Porém, reconheceu que pontos como as regras do BPC precisam ser analisados novamente.

Entre as sugestões dos governadores estão mudanças de regras para os professores, “atingidos de forma muito violenta”, segundo Ibaneis. Ele citou ainda o impacto sobre os policiais militares. Ibaneis considera um equívoco do governo não incluir as mudanças no sistema de aposentadoria dos militares na proposta de hoje. “Existe um sentido de proteção dos militares. Deveria ter aguardado mais um pouco para ter incluído a questão dos militares”, afirmou.

A exclusão dos militares também foi questionada pelo governador do Maranhão. “Se vai mexer nas camadas mais pobres – teoricamente, porque sou contra – e não trata dos militares, simultaneamente… por que esse regime diferenciado?”, questionou Dino. “Isso é inadmissível, não há qualquer justificativa jurídica para isso, a não ser uma opção política de separar o militares do debate”, reclamou, após conhecer a proposta.

Dino alertou que o tem “pegadinhas” e “armadilhas”. “Todas as regras anunciadas como definitivas, na verdade, são provisórias, transitórias até que venha uma lei complementar. Vamos debater, agora, e, amanhã, pode vir outro debate com um quórum baixo para mudar tudo o que está pactuado”.

Ao Fórum, Guedes levou o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, o ministro da Secretaria de Governo, general Alberto Santos Cruz, o secretário de Previdência, Rogério Marinho, os presidentes do Senado e da Câmara, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o líder do governo na Câmara, major Vitor Hugo (PSL-GO).

O governo minimizou o impacto da divulgação das conversas do presidente Jair Bolsonaro com o agora ex-ministro Gustavo Bebianno. “Estou falando da nova Previdência que é o que importa para os brasileiros. Essa questão importa para setores da imprensa brasileira”, afirmou Onyx.

Governadores do Norte e Nordeste concentram as críticas à proposta nas regras do BPC e na aposentadoria dos trabalhadores rurais. O principal argumento é a diferença entre condições de trabalho no campo nessas regiões de outras partes do país.

Fátima Bezerra (PT), do Rio Grande do Norte, fez as críticas mais duras sobre o BPC. Disse que as mudanças no benefício o deixam “desidratado” ao prever pagamento de R$ 400 a partir dos 60 anos. “É uma maldade, uma humilhação. É condenar parcela expressiva de brasileiros à miséria”. Defendeu a consideração de particularidades de cada região. “Não tem como tratar o desigual de maneira igual”, finalizou.