Valor Econômico
21/07/2020

Por Taís Hirata

Com aprovação do novo marco, setor privado quer esclarecer trechos da lei que provocam preocupação

Com a nova lei do saneamento enfim publicada, o foco das companhias privadas do setor, a partir de agora, passa a ser a elaboração dos decretos que irão regulamentar o novo marco legal.

A expectativa das empresas é poder corrigir trechos da lei que geraram preocupação, além de garantir que as normas não criarão problemas no mercado.

Estão previstos aos menos três decretos a partir de agora. O primeiro deles, menos preocupante, irá criar o comitê interministerial previsto na lei.

Outro decreto irá definir a metodologia de comprovação econômico-financeira das companhias. Este último é um dos mais aguardados, já que as empresas terão que provar sua capacidade financeira para fazer jus aos investimentos necessários – sob risco de perder os contratos.

Pela lei, há um prazo de 90 dias para que essa norma seja publicada, mas ainda há algumas divergências sobre a metodologia.

Há duas vertentes sobre como a comprovação poderia ser feita: uma é a definição de alguns indicadores contábeis para medir a capacidade de endividamento e liquidez das empresas. Outra opção, defendida pelo setor privado, é uma avaliação periódica por meio das agências de classificação de risco e da avaliação de crédito dos bancos públicos.

A ideia é que essa análise não seja feita uma única vez, mas que haja um acompanhamento das concessões, que são de longo prazo, segundo Percy Soares Neto, diretor-executivo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon).

A expectativa do setor é que grande parte das estatais não consigam atender aos requisitos. Outra projeção é que isso poderá gerar oportunidades ao mercado, avalia o vice-presidente da Aegea Rogério Tavares. “As empresas que, sozinhas, não consigam demonstrar capacidade de fazer os investimentos poderão buscar parcerias com o setor privado, delegando parte dos serviços via concessão.”

Outro decreto também muito aguardado é aquele que irá regular a atuação da União na formação dos blocos regionais.

Uma das dúvidas, neste caso, é se haverá arranjos para incorporar, nos blocos, concessões já existentes. Esse ponto é importante em Estados nos quais a capital – que costuma ser a principal operação do setor – já tem uma concessão privada em curso. A Abcon prepara uma proposta com sugestões para esse decreto, que não tem prazo para ser publicado.

Para Tavares, seria interessante estudar modelos em que cidades vizinhas possam aderir a uma concessão existente. No entanto, ele diz que não há uma análise jurídica sobre o tema ainda.

Outra preocupação que as empresas esperam ver contemplada nesse decreto é o repasse de recursos federais aos projetos.

Essa questão é uma das que mais incomodou os operadores na versão final da lei. Isso porque o texto sugere que os repasses serão feitos apenas para projetos de blocos regionais. A preocupação é que concessões de municípios isolados passem a ter dificuldade para contrair financiamentos com bancos públicos.

“Esse é ponto de maior atenção para nós. É preciso garantir o acesso aos recursos”, diz Roberto Muniz, diretor da GS Inima.

Hoje, a maioria das concessões em curso são de cidades isoladas. Além disso, há projetos municipais em curso, como a Parceria Público-Privada (PPP) de Cariacica (ES), e a PPP de

Petrolina (PE), que poderiam ser afetadas.

“O município que fez o projeto antes da criação dos blocos regionais, ou que não for incluído nesses blocos, não pode ser penalizado por fazer uma concessão sozinho”, afirma Carlos Henrique Lima, presidente do Conselho de Administração do grupo Águas do Brasil.

Outro temor é o prazo para a publicação desse decreto. “Em 2007, quando foi aprovada a primeira lei do saneamento, a regulamentação demorou três anos para ser assinada. Não queremos repetir uma espera desse tamanho. A expectativa é que os decretos saiam ainda neste ano”, afirma o executivo