Estadão
16/01/2020

Por Saulo Michiles*

Na contramão da grande maioria dos setores econômicos, o ecossistema de startups vive uma ascendente pujante. Fechamos o ano de 2019 com 10 unicórnios – startups que têm valor de mercado de mais de um bilhão de dólares. E este é apenas um dos indicadores do que está por vir em 2020.

A quantidade de unicórnios brasileiros, que nos coloca entre os 10 maiores produtores de unicórnios do mundo, reflete a revolução que vem ocorrendo na base da pirâmide desse ecossistema. Dados da Associação Brasileira de Startups (ABstartups) indicam que o número de startups associadas mais que dobrou de 2017 para 2018 e, atualmente, esse número chega a 13 mil. Para financiar essas empresas de crescimento escalável e base tecnológica, já temos mais de sete mil investidores anjo, segundo a associação Anjos do Brasil. Por fim, segundo o Mapeamento dos Mecanismos de Geração de Empreendimentos Inovadores, já são mais de 363 incubadoras e 57 aceleradoras compondo esse ecossistema simbiótico, que apenas dá os primeiros sinais de maturidade.

Se vimos tudo isso em um ano que foi marcado ainda por fortes instabilidades políticas e a discreta retomada do crescimento econômico, temos tudo para acreditar que 2020 será o ano dos unicórnios e de todo o ecossistema de startups! Não só porque a provável retomada econômica certamente ajudará, ou porque a baixa na taxa básica de juros da economia direciona o capital para investimentos mais arriscados, mas, também, porque o Governo Federal e alguns governos locais já enxergaram que as startups podem ser grandes geradoras de inovação, empregos, renda e tributos.

Nesse sentido, vemos o ambiente legal e regulatório se ajustando, ainda que aos poucos, para abarcar esses novos empreendimentos, a exemplo da Empresa Simples de Crédito, criada pela Lei Complementar 167/19, bem como da Sociedade de Empréstimo entre Pessoas e Sociedade de Crédito Direto, criadas pelo Banco Central, através de legislações com o claro objetivo de impulsionar as “fintechs” – startups que atuam no mercado financeiro. Seguindo este rumo, Susep e CVM já trabalham para criar, em 2020, ambientes regulatórios experimentas (“sandboxes”).

Além disso, o Governo Federal criou o Comitê Nacional de Iniciativas de Apoio a Startups, cujo objetivo é articular as ações do Poder Executivo destinadas às empresas nascentes inovadoras. Já no apagar das luzes de 2019, o Executivo Federal enviou ao Congresso o projeto de Marco Legal das Startups, após meses de debate público, que promete, entre outras coisas, desburocratizar este ambiente de negócios, facilitar o investimento em PUBLICIDADE Ads by Teads Startups, incentivar a contratação pelo Poder Público dessas empresas e adequar as relações de trabalho ao que vem sendo praticado no novo ramo.

Aliás, um dos grandes desafios brasileiros para 2020 são as relações entre trabalhadores e startups. Vivemos um momento de grande insegurança jurídica, visto que em 2019 tivemos decisão do Superior Tribunal de Justiça afirmando que os motoristas de aplicativo não são enquadrados como trabalhadores nos moldes da CLT. Entretanto, juízes trabalhistas ao redor do país não têm compartilhado desse entendimento ao reconhecerem a existência de vínculo trabalhista entre motoristas e startups como a Loggi, nos termos e encargos da CLT.

Naturalmente, ainda temos muitos desafios a vencer, já que o ecossistema de Startups não pode ser totalmente apartado do ambiente empreendedor brasileiro, sabidamente inóspito. No entanto, os dados apresentados, a maturidade dos agentes do mercado e o esforço do Poder Público em incentivar esse segmento vai fazer com que muita gente comece 2020 acreditando não em Papai Noel, mas em unicórnios!

*Saulo Michiles, diretor de Startups e Inovação da AB&DF Advocacia